Inundações são previsíveis e devem ser tratadas pelos prefeitos como riscos à vida da população

É possível mapear possíveis desastres causados pelas chuvas de verão e, assim, evitar que pessoas percam a casa, os móveis ou até a vida

  • Por Helena Degreas
  • 05/01/2021 08h00 – Atualizado em 07/01/2021 14h04

Helena Degreas/Jovem PanBuraco de dois metros de profundidade, provavelmente causado pela chuva, recebe sinalização improvisada para não machucar os mais desatentos

Até que “as águas de março fechem o verão”, muitos lares, comércios, bens materiais e vidas serão perdidos como consequência das chuvas torrenciais que assolam a cidade. É impressionante ler, ano após ano, as mesmas manchetes que tratam dos estragos provocados pelas tempestades. Inundaçõesenchentesdeslizamentosquedas de árvores e afundamentos de asfalto ocasionados por rompimentos de galerias de águas pluviais ainda são tratados como “desastres naturais”, em especial, quando os governos locais falham no gerenciamento dos riscos decorrentes dos efeitos relacionados aos extremos climáticos. Reitero que não são desastres ocasionados apenas por fenômenos naturais extremos: são decorrentes da falta de previsão de nossos gestores públicos dos riscos aos quais os cidadãos estão expostos nesta época do ano.https://53b1b23af142c0c538a0845591c7743b.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

A imagem estampada na coluna desta semana é só mais uma das várias experiências vivenciadas por quem mora nas capitais brasileiras. O diâmetro do buraco é até singelo, mas a profundidade de cerca de 2 metros permite que uma pessoa distraída com seu celular possa ser engolida por ele. Provavelmente, a chuva torrencial sobrecarregou a rede de águas pluviais e o asfalto cedeu. Tentando solucionar a questão, o motorista do ponto de taxi em frente colocou um galho no local, apontando ao prefeito, involuntariamente, que a permeabilização da cidade se faz necessária e que esta é uma das várias ações de baixo custo que podem ser adotadas para melhorar a absorção das águas em diversos pontos da cidade: a substituição do asfalto por grama em alguns casos.PUBLICIDADE

Causou-me estranheza, portanto, ler a plataforma de governo do prefeito reeleito Bruno Covas. Um dos destaques tratava da construção de novos piscinões, que, apesar de necessários, não resolvem as consequências anteriormente citadas. Estas obras são desenvolvidas para conter as águas das chuvas que irão ocupar ruas e avenidas da cidade, evitando inundações, enchentes e prejuízos materiais em alguns pontos. Trata-se de uma ação que está longe de ser a única solução para as enchentes. Não previnem o problema, sempre haverá a necessidade de construção de mais piscinões. Como evitar isso? Antecipar, gerenciar e reduzir os riscos de desastres são atribuições dos gestores locais, pois eles devem atuar criando sistemas de alerta e estabelecendo estruturas específicas para o gerenciamento de crises como essas. Essas ocorrências são previsíveis e encontram-se inclusive mapeadas: uma simples busca na plataforma GeoSampa localiza desde quedas de árvores até deslizamentos e inundações ocorridas na cidade.

Dois excelentes documentos produzidos por secretarias da prefeitura paulistana nos últimos anos podem ser utilizados para a melhoria da plataforma de governo, colocando a questão das inundações numa discussão contemporânea, mais ampla, envolvendo assuntos que compõem a agenda urbana internacional como a gestão de riscos advindos dos extremos climáticos. O primeiro deles é o Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias, que, em um de seus capítulos, destaca a importância da constituição de uma rede de infraestrutura verde (permeabilidade e vegetação) e azul (águas urbanas), abarcando os sistemas naturais também abrigados pelo espaço viário, como arborização, parques lineares, sistemas de biorretenção e paisagismo. Vagas verdes e jardins de chuva em calçadas e áreas residuais de sistemas viários são alguns exemplos. O outro é o Plano Municipal de Áreas Protegidas, Áreas Verdes e Espaços Livres, cuja consulta pública foi recentemente concluída e define uma política de gestão para a provisão de áreas verdes e de proteção do patrimônio ambiental do município de São Paulo. Os dois documentos, elaborados por técnicos municipais após consulta pública, contribuem para o planejamento das consequências advindas dos extremos climáticos aos quais pessoas e bens estão expostos em função do aumento da temperatura no planeta. 

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Poder público deveria ser corresponsável pela morte de Marina Kohler e de tantos outros no trânsito

A revisão de atribuições, responsabilidades e a alocação de recursos para a implementação de diretrizes apresentadas nos dois documentos ampliará a capacidade de resiliência da cidade de São Paulo, restaurando suas estruturas e funções básicas, evitando com isso os riscos à população. É importante que gestores públicos locais incluam o conhecimento das vulnerabilidades existentes e os riscos associados à ocorrência de eventos extremos climáticas ao dia a dia da gestão pública, bem como ao planejamento das cidades, para o bem do cidadão.

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Poder público deveria ser corresponsável pela morte de Marina Kohler e de tantos outros no trânsito

Relatório anual elaborado pela CET aponta que 31 ciclistas e 359 pedestres morreram em 2019 vítimas de atropelamentos; população tem pressa e não tolera mais isso

  • Por Helena Degreas
  • 29/12/2020 12h17 – Atualizado em 30/12/2020 12h16

Helena DegreasMarina Kohler Harkot, de 28 anos, morreu na madrugada de domingo após ter sido atropelada na zona oeste de São Paulo

Dedico minha coluna de hoje à cicloativista Marina Kohler Harkot, atropelada e morta em novembro de 2020 enquanto trafegava de bicicleta pela Avenida Paulo VI, no bairro Sumaré, Zona Oeste de São Paulo. É graças ao seu papel político na defesa de melhores políticas de mobilidade urbana que estamos vivenciando mudanças nos espaços urbanos destinados aos pedestres. O relatório anual elaborado pela Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET) aponta que 31 ciclistas e 359 pedestres morreram em 2019 vítimas de atropelamentos. Família destroçadas, amigos e colegas carentes do abraço e da palavra, sociedade cada vez mais triste. Atropelamentos com vítimas ocorrem diariamente. Não é possível considerar esse fato como natural sabendo que existem soluções para reduzir a zero o número de acidentes com ou sem mortes. Depende da vontade política. Eles estão, inclusive, mapeados, e seus dados encontram-se no portal do GeoSampa.

Segurança viária é um assunto que deve ser cobrado de todos os prefeitos responsáveis pela gestão das cidades brasileiras. Como cidadã, estou cada vez mais irritada com a atuação lenta das prefeituras, vereadores e secretários em relação às mudanças urgentes previstas no Plano de Mobilidade de São Paulo. Todos eles deveriam ser corresponsáveis pela morte da Marina e de tantos outros. A distribuição dos espaços nas ruas é desigual. A pesquisa Origem e Destino realizada pelo Metrô de São Paulo em 2017 informou que foram produzidas 42 milhões de viagens diárias na RMSP. Destas, cerca de 34% foram realizadas por transporte coletivo, 33% por automóveis particulares e 33% foram realizadas por bicicleta e a pé. Qualquer cidadão que anda nas ruas percebe que o espaço destinado à circulação do automóvel particular é muito maior do que aquele destinado ao transporte coletivo, aos pedestres e às bicicletas.

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São Paulo, a exemplo de outras cidades brasileiras, adotou um Plano de Segurança Viária com base na abordagem de Sistema Seguro. Chamado de Vida Segura, o plano propõe ações no âmbito do planejamento da mobilidade urbana que pretendem reduzir as mortes e feridos graves no trânsito até o final de 2030. Apesar do Plano de Mobilidade Urbana ter sido instituído em 2015, algumas ações são incompatíveis com ele e com o Plano de Segurança Viária, por exemplo. É importante lembrar que, em 2017, o então prefeito João Doria cumpriu sua promessa de campanha e, logo após assumir seu mandato, aumentou as velocidades máximas nas marginais Pinheiros e Tietê, de 50 para 60 km/h na via local, de 60 para 70 km/h na via central, e de 70 para 90 km/h na via expressa. O atual prefeito Bruno Covas manteve a alteração do seu antecessor. O resultado não poderia ser outro: houve um amento significativo no número de acidentes com vítimas.

Pesquisas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico indicam que, enquanto a maior parte dos usuários mais vulneráveis (sem proteção) sobrevive a um atropelamento por um automóvel transitando a 30 km/h, a maioria deles tem cerca de 80% de chances de ser morto em uma colisão com um veículo a 50 km/h. Tem sentido uma velocidade tão alta numa via repleta de crianças, idosos ou pessoas atravessando a rua no meio da cidade? A implantação de medidas eficazes e urgentes para a segurança das pessoas deve ser prioridade política. Toda vida é importante. São os representantes eleitos com o seu voto que controlam o orçamento, destinam verbas e definem as prioridades na administração de nossas cidades. São eles os responsáveis pelas vidas que poderão ser salvas nos próximos anos. Temos pressa, prefeito Bruno Covas, não toleramos mais mortes no trânsito.

Em resposta à coluna, a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes enviou a seguinte nota:

Em relação ao texto “Poder público deveria ser corresponsável pela morte de Marina Kohler e de tantos outros no trânsito”, a Prefeitura de São Paulo informa que a atual gestão está comprometida com a ampliação da segurança viária e a consequente redução do número de acidentes e mortes. As medidas executadas mostraram resultado efetivo jamais visto e muito promissor para a preservação da vida. Em 2019, a cidade alcançou o menor índice de vítimas fatais desde que essa informação começou a ser registrada, de 6,44 mortes a cada 100 mil habitantes. O índice de 2020, até outubro, é ainda menor, alcançando 5,97 mortes por 100 mil habitantes. Em 2016, o índice havia sido de 7,07 mortes por 100 mil habitantes.

O Plano de Segurança Viária – Vida Segura, lançado no primeiro semestre de 2019, representa um marco para a cidade em seu esforço para reduzir os acidentes. Trata-se de um documento norteador que organiza e integra ações com o propósito de salvar vidas, com foco principalmente em ciclistas e pedestres. Por meio dele estão sendo implantadas na cidade as Áreas Calmas, as Rotas Escolares Seguras, os Territórios Educadores, além dos programas Pedestre Seguro e Vias Seguras. A atual gestão também planejou, com ampla participação social, e vem executando o Plano Cicloviário. Até o fim deste ano, 60% da malha cicloviária existente estará requalificada, com reforma de guias, sarjetas, novo piso asfáltico e padrão de pintura mais seguro ao ciclista. Também até o fim de 2020, mais 173,5 km de ciclovias e ciclofaixas terão sido entregues à população.

Há outras iniciativas que trouxeram benefícios duradouros para a segurança dos usuários do viário e também para a melhoria da qualidade urbanística da capital, como o primeiro Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias da cidade, publicado neste mês. Um documento fundamental que reúne para projetistas e executores todas as normas que devem ser seguidas nas vias e áreas de uso comum na cidade. Além disso, foi regulamentado o Estatuto do Pedestre, que traz uma série de diretrizes em busca da preservação dos espaços e da segurança do elemento mais vulnerável do sistema viário. Todas essas medidas têm embasamento técnico e inspirações nas melhores práticas conhecidas ao redor do mundo. Em relação às Marginais dos Rios Tietê e Pinheiros, a Prefeitura esclarece que elas retornaram aos limites de velocidade anteriores por se tratarem de vias de trânsito rápido e são, juntamente com a Avenida 23 de Maio, as únicas vias em toda a cidade com velocidades máximas permitidas superiores a 50 km/h.
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E se, no lugar das vagas de estacionamento nas ruas, a prefeitura construísse pracinhas para a gente se sentar?

Transtorno para o motorista ávido por largar sua propriedade privada (leia-se carro) em espaço público, pago ou não, o fato é que os chamados parklets são verdadeiros oásis no dia a dia do cidadão

  • Por Helena Degreas
  • 22/12/2020 08h00

Helena Degreas/Jovem PanOs parklets, pequenas extensões da calçada sobre vagas de automóveis, estão se espalhando pelo Brasil

E se no lugar das vagas de estacionamento nas ruas, as calçadas fossem ampliadas com jardins floridos, guarda-sóis e bancos para que a população pudesse sentar-se, ler um livro, descansar com seu pet, tomar um café no intervalo do trabalho, observar as outras pessoas ou simplesmente ler as notificações nas redes sociais em seus celulares? Parece absurdo, não é? Nem tanto. Prefeitos estão redesenhando suas cidades para que as pessoas possam usufruir dos espaços públicos. Para quem teve a oportunidade de viajar para outros países ou para os fãs de seriados estrangeiros, não é incomum ver calçadas lisinhas com pequenas extensões localizadas sobre vagas de automóveis. Podemos chamá-las de arquiteturas temporárias. No Brasil, recebem o nome de parklets e hoje se espalham em todo o território nacional. Embora sejam criadas e mantidas por estabelecimentos comerciais, desde que seguidos os manuais e a legislação vigente, podem ser eventualmente utilizadas por cidadãos.

Recentemente, a Prefeitura de São Paulo, à exemplo de outras cidades no Brasil e no mundo, abriu uma consulta pública com o intuito de saber a opinião do cidadão sobre o uso de calçadas e vagas de estacionamento de automóveis para o atendimento de bares e restaurantes locais, estendendo o espaço físico disponível da área de serviço interno dos estabelecimentos sobre a rua durante os períodos de pandemia e pós-pandemia. Dito de outra forma, as novas “pracinhas” passam a ter uso comercial para atender os clientes dos restaurantes. O conceito é bom e deve ser ampliado, mas é preciso que esta proposta se desenvolva paralelamente à ampliação das áreas de calçadas sobre as vagas de automóveis, oferecendo espaços livres públicos de qualidade para o cidadão não vinculados ao consumo destes estabelecimentos. Curiosamente, a prefeitura não disponibilizou paralelamente uma consulta pública para perguntar ao paulistano se ele deseja também pracinhas públicas, com bancos e jardins, sobre estas mesmas vagas. Por que não o fez? PUBLICIDADE

Calçadas são parte dos espaços livres de vida do cidadão quando fora de casa ou do trabalho e não devem ser tratadas predominantemente como produto comercializável e com retorno financeiro. A cidade de Nova York foi citada nesta mesma consulta pública como fonte de inspiração e exemplo para o programa. Verdade seja dita: estes espaços existem, mas são parte de um plano de mobilidade urbana que prioriza a segurança e o bem-estar dos cidadãos, composto por mais dez outros programas que incluem: fechamentos temporários e permanentes de faixas de automóveis e ruas inteiras, distribuição de bancos por toda a cidade, intervenções e redesenho de sistemas viários como esquinas e travessias, redes de circulação de pedestres, bairros calmos, com redução de velocidade onde predominam idosos, iluminação viária direcionada ao pedestre e sistema de comunicação visual urbano.


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Pandemia muda a forma como os governos tratam os espaços públicos

Como os demais cidadãos que andam pelas cidades brasileiras, aguardo ansiosamente para que os projetos, programas e ações promovidos pela Prefeitura de São Paulo nas calçadas priorizem o bem-estar e a segurança das pessoas, disponibilizando a oferta não apenas das novas “pracinhas comerciais”, conhecidas como parklets, mas também todas as demais ações propostas pela cidade de Nova York que serviram de inspiração para a consulta pública. Que a inspiração se materialize rapidamente na forma de ações práticas à cidade de São Paulo em 2021. O cidadão agradece.

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Pandemia muda a forma como os governos tratam os espaços públicos

Atualmente, a regra é caminhar com uma boa distância entre as pessoas, mas como fazer isso em cidades cujas calçadas são estreitas?

  • Por Helena Degreas
  • 14/12/2020 14h56 – Atualizado em 14/12/2020 16h030

Conceito de calçada deve ser repensado como um espaço de locomoção que precisa ser projetado pelo corpo de profissionais das prefeituras

Com o avanço da contaminação provocada pelo coronavírus, prefeitos do mundo todo adotaram planos para o distanciamento físico da população como ação necessária para proteger os cidadãos em espaços públicos. Cones, fita e tinta são alguns dos instrumentos utilizados para viabilizar o distanciamento social imposto pela Covid-19. Se no século passado bairros inteiros foram cortados por ruas e avenidas para expandir a malha de circulação do automóvel particular, reservando uma estreita faixa para a locomoção do pedestre, o século XXI é marcado por ideais de sustentabilidade que impactam a mobilidade dos centros urbanos. “Cidades pensadas para pessoas” deveria ser o lema dos gestores públicos brasileiros e, em especial, prefeitos. Mais do que “calçamento de pedras sobre via de terra”, o conceito de calçada deve ser repensado como um espaço de locomoção que precisa ser projetado pelo corpo de profissionais das prefeituras e mantido pelo poder público. Há cidades que não exigem projeto assinado por profissional engenheiro ou arquiteto para a realização de calçadas. O resultado é esse que vivemos em nosso dia a dia.

Não tem mais sentido que os proprietários dos lotes em frente a esse espaço escolham os pisos e mudas que irão “adornar” o caminho dos brasileiros. Trata-se de uma prática que transforma calçadas em locais sem nenhuma garantia de segurança. As prefeituras deveriam prover calçadas confortáveis para suprir as necessidades de todos os cidadãos, independentemente de suas habilidades físicas, pensadas e sinalizadas para garantir não apenas segurança, mas também possibilidades para desfrutar dos mais distintos trajetos de forma prazerosa. Caminhar é a forma mais natural, saudável e econômica de uma pessoa locomover-se. É ter assegurado o direito de acessar áreas de lazer, comércios, parques, restaurantes enfim, viver a sua vida urbana de forma plena, sem restrições.

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Entenda como a mobilidade afeta as cidades e a qualidade de vida

O ano de 2020 marcou uma mudança na forma como os governos estão tratando os espaços livres públicos. Atualmente, a regra é viabilizar o caminhar com uma boa distância entre as pessoas. É difícil, somos seres sociais: gostamos da proximidade física, de trocar ideias, tocar. Mas como um cidadão consegue distanciar-se cerca de cinco passos do outro em cidades cujas calçadas são estreitas? Como é possível em tão curto espaço de tempo modificar o sistema viário com o objetivo de garantir ao cidadão a distância necessária para evitar o contágio?

Prefeitos de cidades como Berlim, Milão, Dublin, New York e Lima criaram extensões ao longo das calçadas com o objetivo de ampliar os espaços disponíveis para a circulação segura de pedestres e ciclistas. Ao excluir áreas de estacionamento de automóveis ou ao eliminar uma das faixas do sistema viário, ampliaram as calçadas utilizando cones, tachões, fitas e tinta no chão, por exemplo. Trata-se do uso de alguns dos instrumentos utilizados pelo urbanismo tático: mudanças rápidas e de baixo custo. Em Paris, a prefeita Anne Hidalgo implementou 650 km de ciclorrotas, enquanto à época o vice-prefeito de Milão, Marco Granelli, iniciou o programa “Ruas Abertas” requalificando e expandindo calçadas e implantando uma malha ciclável e uma rede caminhável em toda a cidade. Em entrevista, ele afirmou que se todos continuassem a dirigir seus carros, não haveria espaço disponível para as pessoas e, por consequência, haveria pouco espaço para a existência de atividades comerciais previstas em ambientes externos, prejudicando o comércio e a economia local. A qualidade de vida do cidadão está diretamente relacionada à qualidade do espaço público que o cerca. Nossas vidas não acontecem apenas dentro dos edifícios. Passear pela cidade sem roteiro pré-determinado, experienciar o prazer de observar lugares e pessoas e sentir o gosto de descobrir novidades em cada esquina é parte da vida pública. Trata-se de civilidade, respeito e consideração para com as pessoas. A cidade é feita para as pessoas.

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Entenda como a mobilidade afeta as cidades e a qualidade de vida

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A cidade do automóvel lentamente vem se humanizando, colocando o ser humano em primeiro lugar, transformando-se em cidades para pessoas

  • Por Helena Degreas
  • 08/12/2020 16h52 – Atualizado em 08/12/2020 16h54

Helena Degreas/Jovem PanAbertura da avenida Paulista para o público aos domingos proporcionou mais lazer e saúde à população

Ao longo do século 20, as políticas de planejamento rodoviaristas adotadas em todo o mundo foram responsáveis pela adaptação física das cidades ao fluxo crescente de veículos motorizados. Sejam caminhões, automóveis particulares, transportes coletivos como ônibus e vans, entre outros, o fato é que a adaptação dos espaços públicos para atender à circulação do transporte motorizado foi, aos poucos, destruindo a qualidade dos ambientes públicos destinados às pessoas. Quem já não passou pela situação constrangedora de sair correndo como se estivesse participando de uma maratona para atravessar um semáforo de tempo curto para o pedestre e longo para carros? Ou ainda, fazer compras em ruas movimentadas e perceber que não há calçada suficiente para acomodar todos os cidadãos que, como você, estão andando no meio da rua? Nestas situações, costumo afirmar que o verdadeiro cidadão é… o automóvel. Para ele, são destinados espaços públicos de qualidade para descanso (estacionamento em vagas reservadas ao longo das calçadas, pagas ou não) e iluminação noturna privilegiada, enquanto o pedestre fica, geralmente, às escuras em praças públicas por exemplo.https://53b1b23af142c0c538a0845591c7743b.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Nos últimos anos, o conceito de mobilidade deixou de ser sinônimo de transporte motorizado. A ele foram incorporados os modos ativos, ou ainda, aqueles que permitem a mobilidade a pé e de bicicleta. Essa é uma excelente notícia para o cidadão. A cidade se preparará para receber… pessoas. Quem diria? Planos e ações alinhadas com as discussões da Agenda Urbana Internacional para a sustentabilidade de nossas cidades geraram diretrizes e metas para o planejamento das cidades, levando governos signatários da Agenda 2030 – incluindo o Brasil – a atuar neste sentido. Ao criar o Estatuto das Cidades (2001), o Ministério das Cidades (2003) promulgou a Lei 12.587/2012, que instituiu a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), obrigando mais de 3.000 municípios com mais de 20 mil habitantes a desenvolver projetos sobre tema. Mais recentemente, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei 14.000/20, que prorroga os prazos para 2022 e 2023 para que as prefeituras elaborem seus planos. Mais de 90% das prefeituras não cumpriram o prazo anterior, situação que impediu os repasses de verbas públicas para obras de mobilidade urbana em seus municípios.PUBLICIDADE

Para além do transporte, os novos planos de mobilidade que estão sendo implantados em cidades como São Paulo, Fortaleza, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Belo Horizonte já vem mostrando resultados positivos na vida das pessoas. O estímulo ao uso dos espaços públicos por meio da restrição e controle do acesso de automóveis em vias públicas, de maneira permanente ou temporária, é um dos resultados. Um exemplo emblemático é a abertura da avenida Paulista (Paulista Aberta) aos domingos e feriados para caminhadas e ciclismo. A implantação de áreas de descanso e parada (parklets, vagas verdes) destinada aos pedestres sobre vagas de estacionamento, pagas ou não, ao lado das calçadas é outro exemplo bem sucedido que resultou dos planos de mobilidade urbana. O aumento da malha cicloviária (ciclovias, ciclorrotas, ciclofaixas e vias compartilhadas) e a ampliação na largura das calçadas (sobre vagas de estacionamento, utilizando instrumentos de intervenção do urbanismo tático) incentivam a prática de atividades físicas por meio do ciclismo e das caminhadas, reduzindo o sedentarismo e melhorando a saúde da população.

Esses exemplos citados apontam para a contribuição dos planos de mobilidade urbana para a revitalização e valorização dos espaços públicos, favorecendo não apenas a economia e a segurança local, mas também a qualidade de vida do cidadão. A cidade do automóvel lentamente vem se humanizando, colocando o ser humano em primeiro lugar, transformando-se em cidades para pessoas.

Publicação original aqui

Bairros calmos, seguros e confortáveis: o direito de envelhecer dignamente

Este post traz um podcast que trata do direito de envelhecer no lugar que você escolheu para morar. Na rua, no bairro e na cidade que você escolheu. De maneira, confortável, segura e digna.

E o que vem a ser isso?
É o lugar em que tudo que você precisa no dia a dia pode ser realizado a pé em até 15, 20 minutinhos da sua casa.
O podcast é um complemento ao post publicado no Portal Acesse.
No artigo chamado –  ‘Ville du 1/4h’: bairros resilientes às diferentes etapas da vida – falei sobre um conceito contemporâneo conhecido como Cidade de 15 minutos que é tema de discussão da Agenda Urbana Internacional e está vinculado aos ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU – Organização das Nações Unidas.
No podcast eu poderia falar também da Cidade Amiga do Idoso mas, quem me conhece, sabe que apesar dos avanços promovidos pela proposta, sou a favor da acessibilidade que segue os princípios de Desenho Universal.
Em outras palavras ou atende a todas as pessoas independente da idade, gênero, etnia, cultura, perfil econômico ou precisa ser repensada para fazê-lo. Fragmentar um bairro em setores que atendem grupos específicos é uma inclusão ruim. Assim, o conceito de cidade a pé, cidade para pessoas, cidade para todos ou cidades e bairros para todas as fases da vida são propostas que vem substituir a cidade pensada para o automóvel. O urbanismo modernista proposto pela Carta de Atenas preconizou a cidade funcional propondo a separação das áreas residencias, de lazer e de trabalho por meio da setorização espacial e do planejamento do uso do solo. A priorização da circulação do automóvel particular, fragmentou a cidade por meio de inúmeras vias expressas. Este documento veio como resposta do ponto de vista dos arquitetos para atender as necessidades de problemas urbanísticos causados pelo rápido crescimento da população nas cidades à época.

Devolver a cidade para as pessoas por meio do redesenho local deve ser prioridade para governantes. O bairro onde moro, aqui em alto de Pinheiros na cidade de São Paulo tem uma população em que a faixa etária predominante é de 50 e poucos anos. Em 2030, cerca de 34% do total dos moradores locais terá por volta de 60 e poucos anos. Ou iniciamos uma revisão do design dos bairros agora, ou em 10 anos estaremos com baixa qualidade de vida.

Preparando as cidades para o envelhecimento da população

Publicado em: Portal Acesse

Descrição da imagem #pratodosverem: Um casal de idosos está andando em uma rua, de mãos dadas. Eles estão com mochilas nas costas. Fim da descrição.
Permitir mais tempo para atravessar a rua incentiva as pessoas mais velhas a sair (Foto: Pixabay)
“Os filhos vão crescendo
E o tempo vai dizendo que agora é pra valer
Os outros vão morrendo
E a gente aprendendo a esquecer”

Em sua canção Envelheço na cidade, Arnaldo Antunes descreve com bom humor, situações do cotidiano de várias pessoas – incluindo, em alguns casos, os próprios leitores deste post. A partir do momento que paramos de crescer, começamos a envelhecer. Ou seja, a partir dos vinte e poucos anos o processo se inicia, mas só fica visível, por volta dos 30…

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), idoso é todo indivíduo com 60 anos ou mais. Ainda estranho esse número… 60… num outro post pretendo falar sobre a geração ageless ou ainda, aquela geração que não tem a idade cronológica apresentada em seu RG.

O Brasil tem mais de 28 milhões de pessoas nessa faixa etária, número que representa 13% da população do país (IBGE). Em 2060, o percentual da população com 65 anos ou mais de idade chegará a 25,5%. Serão 58,2 milhões de pessoas consideradas idosas pela OMS. E aí vai um recado bem sério aos projetistas, designers, arquitetos, engenheiros, planejadores urbanos e formuladores de políticas públicas: ou todos trabalham para preparar os ambientes construídos, ou teremos a imensa maioria da população muito em breve dependente do sistema de saúde público e da previdência social por exemplo.

Estamos envelhecendo e a necessidade de planejar nossas cidades para que as pessoas continuem ativas e independentes deve ser a prioridade.

O envelhecimento é um processo dinâmico e progressivo que leva a alterações bioquímicas, morfológicas, funcionais e psicológicas do ser humano. De certa forma, determina a capacidade de percepção, compreensão e adaptação ao ambiente que nos cerca. Mas para que me preocupar se sou jovem ainda?

“Nem percebi o tempo passar…
não consigo entender as mudanças no espelho”
Autor: Qualquer pessoa daqui a alguns anos

A hora é agora
O nível de civilidade de um país pode ser medido pela qualidade de acolhimento da população oferecida pelos nossos espaços públicos por exemplo. Calçadas lisinhas, amplas, adequadamente iluminadas para passeios noturnos bem como sombreadas para os dias quentes são alguns dos exemplos de boas práticas de projeto urbano que devemos cobrar de nossos políticos.

Cidades agradáveis e aprazíveis são compostas por espaços públicos que acolhem nossos movimentos, comportamentos e expectativas de tal forma que as mudanças que progressivamente vão ocorrendo com as pessoas passem imperceptíveis. São essas pequenas coisas do dia a dia que colaboram com a independência. Será que preciso ter dificuldade para subir no ônibus? Tenho mesmo que reclamar que não consigo enxergar a calçada por que a luz da rua está posicionada para iluminar a via destinada aos carros e não para as pessoas que andam nas calçadas? Quero sentar-me à sombra para descansar um minutinho e só tem banquinho no parque lá longe?

Onde está o problema? Em nós, cidadãos ou nos ambientes e espaços que vivemos e que foram pensados para automóveis? A resposta é clara. Os ambientes são disfuncionais. Simples assim. Nós mudamos nossas cidades e nossos comportamentos diariamente e nossos espaços públicos não acompanham nossas mudanças. Vejam agora com a questão da pandemia da COVID-19. As pessoas precisam estar a cerca de quatro passos de distâncias umas das outras por exemplo> E tem calçada suficiente para isso? Não, não tem. Por que não renunciar às vagas de estacionamento públicas pagas e administradas pela prefeitura e colocar as pessoas para circular também nesses locais? Pessoas contraem Covid-19, adoecem e morrem. Carros não.

As pessoas estão vivendo mais e, como consequência, haverá mais pessoas idosas vivendo nas cidades. Prefeitos, vereadores e secretários deveriam preparar-se para as questões que em breve irão se impor sobre os serviços públicos entendendo que, para além dos problemas, novas oportunidades podem e devem surgir.

Segundo dados do IBGE, em 2043, um quarto da população deverá ter mais de 60 anos, enquanto a proporção de jovens até 14 anos será de apenas 16,3%. Dados do Plano Nacional de Saúde apontam que cerca de 17,3% dos idosos apresentavam limitações funcionais para realizar as atividades instrumentais da vida mais complexas e que envolvem a participação social e que abrange várias ações como a de locomover-se até locais mais distantes dirigindo ou utilizando os meios de transporte público, fazer compras entre outros.

Quais são as decisões que nossos governantes devem tomar diante do envelhecimento populacional? O que podemos cobrar de todos eles já ou nas próximas eleições? Se não buscarmos uma cidadania ativa desde já com lideranças políticas fortes que de fato representem a população que está em processo de envelhecimento, ficaremos reféns de políticas públicas medíocres preocupadas apenas em oferecer festinhas, encontros e saraus para a terceira idade (seja lá o que essa expressão signifique hoje).

Algumas dicas de boas práticas de planejamento urbano que acolhem as mudanças que ocorrem com o processo de envelhecimento:

. As políticas públicas deverão incluir em suas agendas ações que garantam um transporte público mais eficiente e resiliente às necessidades das pessoas. Resiliente é tudo aquilo que se adapta às mudanças.

. Ampliação dos tempos semafóricos: já não se trata mais de discutir buracos na calçada ou a manutenção medíocre dos passeios públicos a que nos acostumamos infelizmente. Quem já não passou pela ridícula situação de sair correndo para atravessar o semáforo da rua onde mora? Precisamos lembrar que daqui a pouquíssimos anos a velocidade do caminhar urbano será reduzida a 3 km/hora; Estudo recente da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo constatou que 97,8% da população idosa não consegue caminhar 4,3 km/h, velocidade exigida pelo padrão apresentado pela Companhia de Engenharia de Tráfego CET-SP para os semáforos da cidade. Na média, a velocidade alcançada pelos voluntários com idade superior a 60 anos foi de 2,7 km/h. Aos 80, essa velocidade diminui para 2 km / h.

. Espaços e lugares para relaxar e observar outras pessoas: já perceberam quanto espaço é destinado ao “descanso” dos carros bem ao lado das calçadas? Por que não ampliar as calçadas e criar pracinhas? Não são parklets (estruturas temporárias criadas e mantidas por donos de comércios em frente aos seus estabelecimentos. São ampliações das calçadas com banquinhos, sombras, iluminação e sinalização vertical com caixa de texto legível e na altura do pedestre, lixeiras e cheios de flores coloridas – por que não? Quantas e quantas vagas de estacionamento poderiam ser substituídas para dar espaços a uma cidade projetada para o benefício do bem-estar humano?

. ‘Cidade de 15 minutos‘: trata-se de um movimento que faz parte das discussões da agenda urbana internacional e que pretende reduzir a distância entre pontos de transporte, lojas, bancos, árvores à sombra, banheiros públicos e melhorar as calçadas. É atualmente uma das principais mudanças implantadas nos planos diretores das cidades como Paris, Londres e inúmeras outras no mundo. Você pode realizar compras, passeios, atividades de educação, transações bancárias em até 15 minutos a pé de sua casa.

As cidades precisam mudar para garantir que com o passar dos anos as pessoas continuem a desempenhar um papel ativo na comunidade, não fiquem isoladas e permaneçam independentes e felizes. Afinal, as cidades são feitas pelas pessoas e, para as pessoas.

Termino com a canção Envelheço na cidade, de Arnaldo Antunes, citada na abertura da coluna!

Portal Acesse

Cientistas alertam para a urgência em declarar emergência climática

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Imagem:  Climate activists in a Fridays for Future rally in Leeds on Friday. Photograph: Danny Lawson/PA Fonte: The Guardian

Nota: a tradução do artigo foi realizada de forma “livre” (não sou tradutora) tem finalidade didática. Sugestões para correção de equívocos na interpretação são bem-vindas.

Texto original na íntegra: clique aqui

William J. Ripple1* , Christopher Wolf1* , Thomas M. Newsome2 , Phoebe Barnard3,4 , William R. Moomaw5 , xxxxx scientist signatories from xxx countries (list in supplemental file S1) 1 Department of Forest Ecosystems and Society, Oregon State University, Corvallis, OR 97331, USA 2 School of Life and Environmental Sciences, The University of Sydney, Sydney, NSW 2006, Australia 3Conservation Biology Institute, 136 SW Washington Avenue, Suite 202, Corvallis, OR 97333, USA 4 African Climate and Development Initiative, University of Cape Town, Cape Town, 7700, South Africa. 5 The Fletcher School and Global Development and Environment Institute, Tufts University, Medford, MA, USA

*Esses autores contribuíram igualmente para o trabalho.

Os cientistas têm a obrigação moral de alertar claramente a humanidade sobre qualquer ameaça catastrófica e dizer como está. ‘Com base nessa obrigação e nos dados apresentados abaixo, proclamamos aqui, com mais de 10.000 cientistas signatários de todo o mundo, uma declaração clara e inequívoca de que existe uma emergência climática no planeta Terra.

Exatamente há 40 anos, cientistas de 50 nações se reuniram na Primeira Conferência Mundial do Clima (Genebra, 1979) e concordaram que havia tendências alarmantes para as mudanças climáticas tornando a necessidade de agir frente a essa questão urgente.

Desde então, foram feitos durante a Cúpula do Rio de 1992, no Protocolo de Kyoto de 1997, no Acordo de Paris de 2015, bem como dezenas de outras assembleias globais e vários cientistas – com avisos explícitos sobre o progresso insuficiente (Ripple et al. 2017) no trato sobre a questão climática. No entanto, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) ainda estão aumentando, com efeitos cada vez mais prejudiciais sobre o clima da Terra. Uma imensa mudança de escala de esforços que precisam ser realizados para conservar nossa biosfera faz-se necessário para evitar sofrimentos incalculáveis devido à crise climática (IPCC 2018).

A maioria das discussões públicas sobre mudanças climáticas baseia-se apenas na temperatura global da superfície, medida inadequada para captar a amplitude das atividades humanas e os perigos reais decorrentes do aquecimento global (Briggs et al. 2015). Os responsáveis pela formulação de políticas públicas e a população precisam urgentemente ter acesso a um conjunto de indicadores que comuniquem os efeitos das atividades humanas nas emissões de GEE (gases de efeito estufa) e os consequentes impactos no clima, no ambiente e na sociedade. Com base em trabalhos anteriores (consulte o arquivo suplementar S2), apresentamos um conjunto de sinais vitais gráficos[i] de mudanças climáticas ocorridas nos últimos 40 anos pelas atividades humanas que podem afetar as Emissões de GEE / mudança climática (Figura 1) e impactos climáticos reais (Figura 2). Usamos apenas conjuntos de dados relevantes, claros, compreensíveis e sistematicamente coletados e atualizados anualmente dos últimos cinco anos.

A crise climática está intimamente ligada ao consumo excessivo associado a um estilo de vida rico. A maioria dos países ricos são os principais responsáveis pelas emissões históricas de GEE e geralmente têm as maiores emissões per capita (Tabela S1). Aqui, mostramos padrões gerais, principalmente em escala global, assim como também são muitos os esforços climáticos que envolvem regiões e países individualmente. Nossos sinais vitais são projetados para serem úteis ao público, aos formuladores de políticas, à comunidade empresarial e àqueles que trabalham na implementação do acordo climático de Paris, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e aos objetivos Convenção da Diversidade Biológica de Aichi.

Tabela 1: Quadro S1 Resumos regionais para os 24 países e a União Europeia. As variáveis mostradas tratam da emissão de “CO²” (emissões totais de CO² associadas ao consumo de combustíveis fósseis em mega toneladas de CO²), da “População” tamanho da população em milhões), do “CO² / capita” (emissões de CO² per capita em toneladas por pessoa), “compartilhar” (porcentagem de todas as emissões de CO² associadas ao consumo de combustíveis fósseis em comparação com o total global) e “PIB / capita” (produto interno bruto per capita em dólares dos EUA por pessoa). Todos os dados são do ano 2018, exceto o PIB do Irã, que é de 2017 (a estimativa de 2018 ainda não estava disponível). Detalhes adicionais nas variáveis são fornecidas nas informações suplementares abaixo.

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Os sinais profundamente preocupantes das atividades humanas incluem aumentos sistemáticos da população humana quanto na de animais ruminantes como também aumentos significativos na produção de carne per capita, no produto interno bruto mundial, na perda global de cobertura de áreas florestadas, no consumo de combustíveis fósseis, mo número de passageiros transportados, nas emissões de dióxido de carbono (CO²) e nas emissões de CO² per capita desde 2000 (Figura 1, ficha suplementar S2).

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Figura 1. Mudança nas atividades humanas globais de 1979 até o presente. Esses indicadores estão vinculados ao menos, em parte, às mudanças climáticas. No painel (f), a perda anual de cobertura de árvores pode ser por qualquer motivo (por exemplo, incêndio florestal, colheita nas plantações de árvores ou conversão de florestas em terras agrícolas). O ganho da floresta não está envolvido no cálculo da perda de cobertura arbórea. No painel (h), “GT oe / ano” é a abreviação de gigatoneladas de equivalente de petróleo por ano; a hidroeletricidade e a energia nuclear são mostradas na Figura S2. As taxas mostradas nos painéis são as mudanças percentuais por década em todo o intervalo da série temporal. Os dados anuais são mostrados usando pontos cinza. Linhas pretas são linhas de tendência suaves de regressão local. Fontes e detalhes adicionais sobre cada variável é fornecida no arquivo suplementar S2, incluindo a Tabela S2.

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Figura S1. – Dióxido de carbono médio mensal medido no Observatório Mauna Loa, Havaí. Os dados de dióxido de carbono (curva preta), medidos como a fração molar no ar seco, em Mauna Loa constituem o registro mais longo de medições diretas de CO² na atmosfera. […] A linha preta representa os valores médios mensais, centralizados no meio de cada mês. A linha vermelha representa o mesmo, depois da correção para o ciclo sazonal médio. Este último é determinado como uma média móvel de SETE ciclos sazonais adjacentes, centrados no mês a ser corrigido, exceto o primeiro e o último TRÊS e anos e meio de registro, em que o ciclo sazonal foi calculado em média nos primeiros e últimos sete anos, respectivamente. Fonte https://www.esrl.noaa.gov/gmd/ccgg/trends/

Os sinais profundamente preocupantes das atividades humanas incluem aumentos sistemáticos tanto da população humana quanto de animais ruminantes. Também vem ocorrendo aumento significativo aumentos na produção de carne per capita, no produto interno bruto mundial, na perda global de cobertura florestada, no consumo de combustíveis fósseis, no número de passageiros transportados, nas emissões de dióxido de carbono (CO²) e nas emissões de CO² per capita desde 2000 (Figura 1, ficha suplementar S2). Sinais encorajadores incluem a redução das taxas globais de fertilidade (nascimento) (Figura 1b), a desaceleração da perda de floresta na Amazônia brasileira (Figura 1g), o aumento do consumo de energia solar e eólica (Figura 1h), a redução do investimento institucional na produção de combustível em mais de sete trilhões de dólares americanos (Figura 1j) e a proporção de emissões de GEE cobertos pelo preço do carbono (Figura 1m). No entanto, o declínio nas taxas de fertilidade humana desacelerou significativamente nos últimos 20 anos (Figura 1b) e o ritmo de perda de florestas na Amazônia brasileira começou a aumentar novamente (Figura 1g). O consumo de energia solar e eólica aumentou 373% por década mesmo assim em 2018 ainda era 28 vezes menor que o consumo de combustível fóssil (gás, carvão, petróleo) (Figura 1h). Em 2018, aproximadamente 14,0% das emissões globais de GEE eram cobertas pelo preço do carbono (Figura 1m), mas o preço médio global ponderado das emissões por tonelada de dióxido de carbono foi de apenas US $ 15,25 EUA (Figura 1n). É necessário um preço de taxa de carbono muito mais alto (IPCC 2018, Seção 2.5.2.1). Os subsídios anuais a combustíveis fósseis para empresas de energia têm flutuado e, devido a um aumento recente, foram superiores a US $ 400 bilhões em 2018 (Figura 1o).

O aquecimento dos oceanos, o aumento do nível do mar, os incêndios nos territórios dos Estados Unidos e demais condições climáticas cresceram de forma significativa impactando a vida marinha, de água doce e terrestre, o plâncton e corais, peixes e florestas (IPCC 2018, 2019). Essas questões apontam para a necessidade urgente de ação.

Apesar de 40 anos de negociações climáticas globais, com poucas exceções, a condução dos negócios manteve-se igual levando ao fracasso em lidar com essa situação (Figura 1). A crise climática chegou e está se acelerando mais rapidamente do que a maioria dos cientistas esperava (Figura 2,IPCC 2018). É mais grave do que o previsto, ameaçando os ecossistemas naturais e o destino da humanidade (IPCC 2019).  Especialmente preocupantes são os potenciais pontos de inflexão climática e os feedbacks que a natureza vem demonstrando (atmosféricos, marinhos e terrestres) que apontam para uma catastrófica “Terra da estufa”, muito além do controle dos seres humanos (Steffen et al. 2018). Essas reações em cadeia do clima podem causar perturbações significativas nos ecossistemas, na sociedade e nas economias, potencialmente criando grandes áreas inabitáveis na Terra.

Para garantir um futuro sustentável, precisamos mudar a maneira como vivemos, de forma a melhorar os sinais vitais resumidos em nossos gráficos. O crescimento econômico e o populacional estão entre os fatores mais importantes para o aumento das emissões de CO² oriundas da combustão fóssil (Pachauri et al. 2014, Bongaarts e O‘Neill 2018); portanto, precisamos de transformações ousadas e drásticas em relação às políticas econômicas e populacionais. Sugerimos seis etapas críticas e inter-relacionadas (em nenhuma ordem específica) que governos, empresas e o resto da humanidade podem adotar para diminuir os piores efeitos das mudanças climáticas. Essas são etapas importantes, mas não são as únicas ações necessárias ou possíveis (Pachauri et al. 2014; IPCC 2018, 2019).

  1. Energia: O mundo deve implementar rapidamente práticas maciças de eficiência e conservação de energia, substituir combustíveis fósseis por fontes renováveis de baixo carbono (Figura 1h) e outras fontes de energia mais limpas, mais seguras para as pessoas e o meio ambiente (Figura S2). Devemos deixar estoques remanescentes de combustíveis fósseis no solo [ver linhas do tempo no IPCC (2018)] e buscar cuidadosamente emissões negativas efetivas usando tecnologias como a extração de carbono da fonte e da captura do ar, aprimorando os sistemas naturais (Etapa 3 ) Os países mais ricos precisam apoiar os países mais pobres na transição para esta mudança nas fontes de energia. Devemos eliminar rapidamente os subsídios às empresas de combustíveis fósseis (Figura 1o) e usar esquemas eficazes e justos para aumentar constantemente os preços do carbono para restringir o uso de combustíveis fósseis;
  2. Poluentes de vida curta. Precisamos reduzir rapidamente as emissões de poluentes climáticos de curta duração, incluindo metano (Figura 2b), carbono preto (fuligem) e hidrofluorcarbonetos (HFCs). Isso poderia retardar os feedbacks climáticos e potencialmente reduzir a tendência de aquecimento de curto prazo em mais de 50% nas próximas décadas, salvando milhões de vidas e aumentando o rendimento das culturas devido à redução da poluição do ar (Shindell et al. 2017). A alteração de Kigali de 2016 para eliminar gradualmente os HFCs é bem-vinda;
  3. Natureza. Nós devemos proteger e restaurar os ecossistemas da Terra. Fitoplâncton, recifes de coral, florestas, savanas, pradarias, pântanos, turfeiras, solos, manguezais e gramíneas marinhas contribuem muito para o sequestro de CO² atmosférico. Plantas marinhas e terrestres, animais e microrganismos desempenham papéis significativos no ciclo e armazenamento de carbono e nutrientes. Precisamos reduzir rapidamente a perda de florestas e biodiversidade (Figura 1f-1g), protegendo as florestas primárias e intactas restantes, especialmente aquelas com reservas de alto carbono e florestas mais jovens, com capacidade de sequestrar rapidamente o carbono (proforestação), enquanto realizamos reflorestamento e arborização, onde for apropriado, em escalas significativas. Embora a terra disponível possa ser limitadora em alguns lugares, até um terço das reduções de emissões necessárias até 2030 para atender ao acordo de Paris (<2˚C) poderiam ser obtidas com essas soluções climáticas naturais (Griscom et al. 2017).
  4.  Comida. Comer principalmente alimentos à base de plantas e reduzir o consumo global de produtos de origem animal (Figura 1c-1d), especialmente gado ruminante (Ripple et al. 2014), pode melhorar a saúde humana e reduzir significativamente as emissões de GEE (incluindo o metano na etapa 2). Além disso, isso liberará as terras cultivadas para o cultivo de plantas necessárias aos seres humanos em vez de alimentos liberando áreas de pastagens como apoio às soluções climáticas naturais (etapa 3). Práticas de cultivo para conservação, aumentam o carbono do solo e são de vital importância. Precisamos reduzir drasticamente a enorme quantidade de desperdício de alimentos em todo o mundo.
  5. Economia. A extração excessiva de materiais e a superexploração de ecossistemas, impulsionadas pelo crescimento econômico, devem ser rapidamente reduzidas para manter a sustentabilidade a longo prazo da biosfera. Precisamos de uma economia livre de carbono que aborde explicitamente a dependência humana da biosfera e políticas que orientem as decisões econômicas do acordo. As metas do crescimento do PIB e a busca incessante de riqueza precisam ser revistas com o objetivo de apoiar o bem estar humano, o apoio aos ecossistemas priorizando as necessidades básicas e a redução das desigualdades.
  6. População. Ainda aumentando em cerca de 80 milhões de pessoas por ano ou > 200.000 por dia (Figura 1a-1b), devemos estabilizar e, idealmente, reduzir gradualmente a população mundial dentro de uma estrutura que garanta a integridade social. Existem políticas comprovadas e eficazes que fortalecem os direitos humanos, diminuindo as taxas de fertilidade e diminuindo os impactos do crescimento da população nas emissões de GEE e na perda de biodiversidade. Essas políticas envolvem a disponibilização de serviços de planejamento familiar a todas as pessoas (e a remoção de barreiras ao acesso) e a obtenção da equidade total de gênero, incluindo a educação primária e secundária como norma global para todos, especialmente meninas e mulheres jovens (Bongaarts e O’Neill 2018).

Mitigar e adaptar-se às mudanças climáticas, honrando a diversidade dos seres humanos, implica grandes transformações nas maneiras como nossa sociedade global funciona e interage com os ecossistemas naturais. Somos encorajados por uma recente onda de preocupação. Órgãos governamentais estão fazendo declarações de emergência climática. Os estudantes são impressionantes. Os processos de ecocídio estão em andamento nos tribunais. Os movimentos de cidadãos de base estão exigindo mudanças, e muitos países, estados e províncias, cidades e empresas estão respondendo ativamente.

Como uma Aliança dos Cientistas do Mundo, estamos prontos para ajudar os tomadores de decisão em uma transição justa para um futuro sustentável e equitativo. Instamos o uso generalizado de sinais vitais, que permitirão melhorar a qualidade das decisões daqueles que são responsáveis pela formulação de políticas, do setor privado ao público, e melhorar o entendimento e a magnitude dessa crise, além de acompanhar o progresso e realinhar as prioridades para aliviar as mudanças climáticas.

A boa notícia é que essa mudança transformadora, com justiça social e econômica para todos, promete muito mais bem-estar humano a longo prazo do que os negócios de sempre. Acreditamos que as perspectivas serão maiores se os tomadores de decisão e toda a humanidade responderem prontamente a esse aviso e declaração de emergência climática e agirem para sustentar a vida no planeta Terra, nosso único lar.

Revisores colaboradores

Franz Baumann, Ferdinando Boero, Doug Boucher, Stephen Briggs, Peter Carter, Rick Cavicchioli, Milton Cole, Eileen Crist, Dominick A. DellaSala, Paul Ehrlich, Iñaki Garcia-De-Cortazar, Daniel Gilfillan, Alison Green, Tom Green, Jillian Gregg, Paul Grogan, John Guillebaud, John Harte, Nick Houtman, Charles Kennel, Christopher Martius, Frederico Mestre, Jennie Miller, David Pengelley, Chris Rapley, Klaus Rohde, Phil Sollins, Sabrina Speich, David Victor, Henrik Wahren, and Roger Worthington

Financiamento

O Worthy Garden Club forneceu financiamento parcial para este projeto.

Site do Projeto
Para visualizar o site da Alliance of World Scientists ou assinar este documento, vá para:
https://scientistswarning.forestry.oregonstate.edu/

Material suplementar

Os dados suplementares estão disponíveis no BIOSCI online, incluindo o arquivo suplementar 1 (lista completa de todos xxxxx signatários) e arquivo suplementar 2.

Referências

Briggs S, Kennel CF, Victor DG. 2015. Planetary vital signs. Nature Climate Change 5:969.

Bongaarts J, O‘Neill BC. 2018. Global warming policy: Is population left out in the cold? Science 361:650–652.

Griscom BW et al. 2017. Natural climate solutions. Proceedings of the National Academy of Sciences 114:11645–11650.

IPCC. 2018. Global Warming of 1.5° C: An IPCC Special Report. Intergovernmental Panel on Climate Change.

IPCC. 2019. Climate Change and Land. Intergovernmental Panel on Climate Change.

Pachauri RK et al. 2014. Climate change 2014: synthesis report. Contribution of Working Groups I, II and III to the fifth assessment report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Intergovernmental Panel on Climate Change.

Ripple WJ, Smith P, Haberl H, Montzka SA, McAlpine C, Boucher DH. 2014. Ruminants, climate change and climate policy. Nature Climate Change 4:2–5.

Ripple WJ, Wolf C, Newsome TM, Galetti M, Alamgir M, Crist E, Mahmoud MI, Laurance WF. 2017. World Scientists‘ Warning to Humanity: A Second Notice. BioScience.

Shindell D, Borgford-Parnell N, Brauer M, Haines A, Kuylenstierna J, Leonard S, Ramanathan V, Ravishankara A, Amann M, Srivastava L. 2017. A climate policy pathway for near-and long-term benefits. Science 356:493–494.

Steffen W et al. 2018. Trajectories of the Earth System in the Anthropocene. Proceedings of the National Academy of Sciences 115:8252–8259.

Observação:
O material complementar poderá ser lido ma íntegra no artigo original que se encontra aqui
Documento Original

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

[i] Sinais vitais da terra – International Geosphere-Biosphere Programme include global land surface temperature anomalies, atmospheric carbon dioxide, arctic minimum sea ice extent and global mean sea level.

C+Idade: critérios para planejar cidades habitáveis para todas as etapas da vida

Livability Categories - AARP
AARP Livability Index: Great Neighborhoods for All Ages

Fonte: Sugiro que assistam ao vídeo da //players.brightcove.net/3772599298001/ryhhcDoG_default/index.html?videoId=5836018001001” target=”_blank” rel=”noopener”>AARP

Alguma vez você já se perguntou como o lugar onde você deve ser para que você se sinta bem e feliz?

Eu sim. Muitas vezes ao longo da minha vida. Mais jovem, com filhos crescendo, queria proximidade de escolas e áreas públicas de recreação;

E hoje?

Minha resposta para o dia de hoje:
. deve ter calçadas amplas e com piso lisinho, confortáveis, sombreadas por árvores durante os dias quentes e bem iluminadas à noite;
. realizar as comprinhas diárias sem precisar tirar o carro da garagem;
. locomover-me utilizando transporte público a preço acessível para qualquer lugar;
. localizar-se próximo a parques, áreas verdes;
. deve ser um local seguro;
. garantir qualidade sonora ou ainda, ser um lugar livre de barulhos excessivos (ausência de ruídos provocados pela falta de civilidade gerada pela convivência social que desrespeita e desconhece limites) entre vários outros desejos.

Dependendo de quem está lendo o post, provavelmente a ausência de hospitais e postos de saúde deve ter chamado a atenção. Para minha mãe, atendimento médico próximo é fundamental para a manutenção de sua qualidade de vida.

“Cidade é infraestrutura pública” dizia em sala de aula e, com razão, meu saudoso Prof. Milton Santos.

Tenho consciência de que como arquiteta e urbanista, meus limites se restringem ao ensino e ao exercício profissional. Como cidadã sou membro voluntário de conselhos que discutem políticas públicas urbanas e exijo o direito de viver em cidades com qualidade de gestão dos espaços públicos. Mudança de cultura na gestão da coisa pública é um processo longo, difícil mas necessários. Tenho responsabilidade para com as gerações futuras.

Qualidade de vida urbana ao longo da vida: o que você responderia para essa questão? O que você precisa para viver num bairro agradável por muitos e muitos anos?

. um hospital ou posto de saúde?
. um médico ou um cinema?
. lanchonetes, restaurantes ou áreas comerciais?

Cada pessoa vai querer algo diferente e é isso que torna a vida na cidade tão única.

Cada cidade diferente do país tem sua própria personalidade!

Você se pergunta se a cidade ou o bairro atual está atendendo às necessidades atuais ou talvez às necessidades futuras?

Existe um índice de habitabilidade criado pela AARP que apresenta diretrizes de planejamento / projeto e design urbanos que podem colaborar para o exercício de uma vida independente para seus cidadãos mais velhos. Destina-se a ser um guia para melhorias, bem como uma maneira de comparar cidades em todo o país.

O índice contém 60 fatores para compradores de imóveis que desejam se mudar para um local mais habitável. É natural que as pessoas queiram permanecer em sua própria casa á medida que envelhece, portanto, o local precisa ter as condições necessárias para garantir a independência nos aspectos que compõem a vida cotidiana: tarefas e demandas gerais da vida doméstica; comunicação; mobilidade; cuidado pessoal; interações e relacionamentos interpessoais; participação na vida comunitária, social e cívica

Um bairro habitável é descrito como aquele que possui moradia, transporte e outras opções que permitem e facilitam a independência dos idosos nos diversos aspectos da vida.

Ao projetar para um cidadão idoso, você atende às necessidades físicas, sociais e intelectuais para pessoas que se encontram em QUALQUER FASE DA VIDA OU FAIXA ETÁRIA

Como é mensurada a habitabilidade dos lugares?
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Fonte clique aqui

As pessoas experimentam as comunidades como um todo, de forma que a AARP analisou vários aspectos da habitabilidade para obter uma visão completa. O Índice de habitabilidade avalia sete grandes categorias de habitabilidade comunitária: moradia, bairro, transporte, meio ambiente, saúde, engajamento e oportunidade. Valores métricos e pontos de política em cada categoria são combinados para criar a pontuação da categoria. Essas pontuações da categoria são calculadas como média para criar a pontuação total de habitabilidade de um local. São 60 ítens que compõem o índice.

DOMÍNIO 1 – ESPAÇOS E EDIFÍCIOS AO AR LIVRE

Espaços ao ar livre e edifícios onde as pessoas podem se reunir, como parques, calçadas, ruas seguras, assentos ao ar livre e edifícios acessíveis. Como espaços públicos, as calçadas são “a porta de entrada” de uma comunidade e bairro, ativando ruas social e economicamente. Faz pouco sentido que em tantos bairros e cidades brasileiras as calçadas sejam raras e até inexistentes. Faço parte do grupo de pesquisas QUAPA-SEL e tive a oportunidade de conhecer inúmeras cidades brasileiras. Mesmo em São Paulo, onde vivo, a existência de calçadas é uma exceção à regra infelizmente. Se quiserem conhecer um pouco mais sobre as discussões que realizamos na Câmara Temática de Mobilidade a Pé, acesso o link dos relatórios. Lá você terá a oportunidade de vivenciar as discussões do grupo desde que foi criado.

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Men and Woman sitting on brown wooden bench by Monica Silveira

DOMÍNIO 2 – OPÇÕES DE TRANSPORTE

Opções de transporte ativo que dão aos não-motoristas acesso a serviços, locais e pessoas. As comunidades tranquilas e amigas da caminhabilidade e da bicicleta são boas para pessoas e negócios. Devem ser construídas políticas públicas e ações dos governos locais para o incentivo da modalidade de transporte ativo.

People Walking Near Trees
People Walking Near Trees by Lina KivaKa

DOMÍNIO 3 – MORADIA APROPRIADAMENTE PROJETADA/MODIFICADA E ACESSÍVEL

A revitalização sem deslocamento beneficia todos os residentes, independentemente de renda, idade u condição física. As comunidades habitáveis ​​oferecem moradia para qualquer situação ou etapa da vida como idosos cujos filhos se mudaram ou cujos cônjuges morreram, famílias monoparentais, casais sem filhos ou pessoas que optam por compartilhar a habitação com colegas de quarto ou preferem moradias multifamiliares em vez de moradias unifamiliares ou casas isoladas. Entendo que a construção de locais exclusivos para idosos colabore para a desintegração da interação e do convívio social prejudicando a vida comunitária e a saúde do indivíduo. Esse é um exemplo recente de uma proposta de projeto realizada pelo escritório Vigliecca & Associados.  A proposta projetual é resultado do programa Morar no Centro, iniciativa da Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (COHAB), órgão encarregado de dar resposta às demandas de habitação social na cidade de São Paulo.

DOMÍNIO 4 – PARTICIPAÇÃO SOCIAL

Participação social para evitar o isolamento e a solidão. A atividade social aumenta a mobilidade, as perspectivas e o desejo de cuidar melhor de si mesmo. Solidão pode realmente prejudicar o sistema imunológico. Fica aqui uma leitura recente de artigo acadêmico como sugestão.

DOMÍNIO 5 – RESPEITO E INCLUSÃO SOCIAL

Respeito e inclusão social por meio de atividades intergeracionais. Os laços intergeracionais não precisam ser tradicionais ou biológicos. Os mentores de adultos mais velhos podem fazer uma diferença significativa na vida de uma criança. O envolvimento de um adulto confiável e atencioso ajuda as crianças a desenvolver habilidades para a vida e constrói auto-estima e confiança.

DOMÍNIO 6 – PARTICIPAÇÃO CÍVICA E EMPREGO

Participação cívica e emprego que possibilitam trabalho, voluntariado e engajamento ativo. As pessoas que estão ativamente envolvidas no serviço são cidadãos empoderados, emocionalmente conectados à comunidade e mais propensos a votar. A participação na sociedade civil está fortemente correlacionada com a confiança em outras pessoas.

DOMÍNIO 7 – COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO

Comunicação e informação divulgadas por meio de uma variedade de canais para alcançar até aqueles que não tem acesso a informações via web multi-telas por exemplo. Como manter-se informado e, por conseguinte, participar de conversas e trocas de informações sobre assuntos cotidianos com outras pessoas ao seu redor? Alguns influenciadores digitais 65+

DOMÍNIO 8 – SERVIÇOS COMUNITÁRIOS E DE SAÚDE

Serviços comunitários e de saúde devem ser distribuídos em toda a cidade. Políticas Públicas Urbanas que utilizem dados como processo são úteis no entendimento das mudanças dos seus habitantes a partir de perspectiva histórica. O “território fala” e apresenta suas necessidades que estão por vir. Identificar o processo de envelhecimento na cidade, permite ao gestor publico programar investimentos que atendam as necessidades da população.A prefeitura de NYCLondres são bons exemplos de ações que nasceram há décadas e que viabilizaram realizações que hoje permitem cidades com melhor qualidade de vida para a população idosa.

Em tempo: este post foi inspirado pela leitura do seguinte material:
The Eight Domaisn of Livability
AARP Livability Index

A idade cronológica define um idoso?

 

Perrault1

Figura 1: Por Gustave Doré – http://bit.ly/2Pl1x4v, Domínio público, http://bit.ly/2Pl1iGR

Num mundo repleto de desafios que governos e populações precisam vencer diariamente, existe um que, apesar de previsível, é sistematicamente esquecido, embora certo para todos: como manter-se ativo, produtivo e saudável apesar das consequências que o famigerado processo de envelhecimento traz ao corpo e ao intelecto?

Pela primeira vez na história a mais da metade da população mundial tem a possibilidade de viver mais de 60 anos e esta situação impacta cidades, edifícios, sistemas de saúde, assistência social e orçamentos públicos.

Como governos e pessoas vem tratando este assunto?

Redigido pela Organização Mundial da Saúde – OMS, agência da Organização das Nações Unidas – ONU responsável pelas diretrizes que organizam as discussões de uma agenda internacional que trata das questões de saúde, o Relatório Mundial sobre Envelhecimento e a Saúde aponta respostas a estes desafios e recomenda mudanças na maneira de formular políticas para o envelhecimento da população e na prestação de serviços públicos.

A imagem que temos dos idosos muitas vezes foi construída lá na infância. Dos desenhos animados que assistimos na TV ou nos nas imagens que ilustram os livros infantis, os idosos são retratados como indivíduos frágeis, de cabelinhos brancos e cabelo preso, curvados utilizando bengalas…

Suposições e percepções construídas que carecem de fundamentação científica, geram discussões sobre estereótipos obsoletos e vem pautando as questões sobre os idosos. Quem já ne se viu pensando numa pessoa mais velha como a imagem acima que ilustra os contos dos irmãos Grimm?

Se não existe uma “pessoa típica”, então não há como associar um “idoso” ou o “velho” utilizando a imagem “típica” dos desenhos animados e contos.

Somos todos AGELESS!

Figura 2: Com seus 97 anos, Iris Apfel é uma das mulheres mais famosas e inspiradoras do mundo da moda. O sucesso nos negócios e a fama só aconteceram depois dos seus 80 anos. mesmo com a mobilidade reduzida, é uma mulher ativa e permanece no comando de suas empresas ainda hoje.

Rastejar, gatinhar, ficar em pé, aprender a andar, correr, pular, nadar e tantas outras habilidades desenvolvidas até a vida adulta, começam a modificar-se com o passar dos anos.

E mais: dados empíricos apontam que a perda das habilidades e capacidades do corpo e do intelecto estão apenas parcialmente relacionadas à idade cronológica. A diversidade resultante no âmbito da saúde dos idosos não é aleatória e nem sempre se aplica a todo o grupo “acima de 60 anos” por exemplo.

As habilidades e necessidades baseiam-se em eventos que ocorreram ao longo da vida. Embora a longo prazo a maioria das pessoas idosas sofra vários problemas de saúde, a velhice não implica necessariamente dependência. O relatório aponta que, o contrário do que se crê, o envelhecimento tem menor influência nas despesas com saúde do que outros fatores, como o alto custo de novas tecnologias médicas e demais prestações de serviços associados a estas tecnologias.

Há oportunidade de redirecionar as discussões levando-as para o campo das oportunidades a partir de uma série de ações concretas que podem ser adaptadas para uso em países de todos os níveis de desenvolvimento econômico.

A agenda internacional de discussões contemporânea sobre o tema enfatiza o envelhecimento saudável e a independência funcional. É uma discussão muito maior do que àquela associada à ausência de doença. Os maiores gastos encontram-se na promoção da capacidade funcional do corpo e do intelecto para a manutenção da dignidade e da independência. A abordagem deve ser concentrada na revisão dos sistemas de saúde de um modelo puramente curativo para um modelo de prestação de um cuidado integral focado nas necessidades dos idosos.

Cabe aos governos rever sua concepção de envelhecimento e criar políticas públicas, projetos, programas e ações que invistam nas adaptações necessárias para a construção de um mundo favorável a todas as fases da vida.

O que penso da minha idade cronológica? “Velha é a vovozinha ageless”! uma vida é pouca para tudo o que desejo realizar!