Passou da hora de os governos se anteciparem a calamidades e garantirem a segurança nas cidades e áreas rurais

Eventos afetam diretamente a vida da população, impactando a agricultura com secas e inundações, prejudicando safras, danificando plantações e ameaçando a segurança alimentar

Por Helena Degreas 22/06/2024 07h00 para a Jovem Pan News

Nas áreas urbanas, chuvas intensas podem causar inundações, deslizamentos de terra e danos à infraestrutura

A cada ano, os fenômenos El Niño e La Niña nos convidam para um baile de proporções globais, onde a natureza, sufocada pelo peso das emissões de gases de efeito estufa geradas pela matriz energética vigente, se apresenta como uma anfitriã implacável. Assim como numa dança, ciclos naturais antes ritmados, fluidos e harmoniosos agora exibem uma coreografia cruel, desequilibrando os padrões climáticos sobre a América do Sul e prometendo ora tempestades, ora secas mais prolongadas. As mudanças climáticas por nós provocadas exacerbaram esses fenômenos, transformando eventos periódicos em crises contínuas que afetam milhões de vidas, desafiam sistemas agrícolas e testam a resiliência de comunidades urbanas em todo o mundo. A situação tornou-se uma questão de segurança pública que exige planejamento antecipado e ações coordenadas entre governos para mitigar seus impactos devastadores à vida.

O Oceano Pacífico guarda segredos que impactam o clima do planeta. El Niño e La Niña, as duas fases do ciclo climático ENSO (Oscilação Sul Equatorial), alteram a temperatura das águas superficiais dos oceanos e influenciam padrões climáticos em diversas regiões, incluindo o Brasil. El Niño, com seu aquecimento das águas do Pacífico, gera secas em algumas áreas e chuvas torrenciais em outras, enquanto La Niña provoca o resfriamento das águas do Pacífico, trazendo efeitos opostos. Esses eventos afetam diretamente a vida da população, impactando a agricultura com secas e inundações, prejudicando safras, danificando plantações e ameaçando a segurança alimentar, potencialmente levando à fome em regiões vulneráveis. Entre os efeitos está a migração forçada de pessoas que, deixando suas casas, transformam-se em refugiados climáticos, aumentando a pressão sobre áreas urbanas e os sistemas de assistência social.

Nas áreas urbanas, chuvas intensas podem causar inundações, deslizamentos de terra e danos à infraestrutura, afetando transporte, energia e habitação. Além disso, El Niño e La Niña agravam problemas de saúde, como doenças transmitidas por vetores, aumentam os casos de problemas respiratórios e comprometem o acesso à água potável. As perdas econômicas são significativas, afetando diversos setores e exigindo uma resposta coordenada para mitigar seus impactos. Atualmente, o fenômeno El Niño chegou ao fim e foi substituído por La Niña, que envolve o resfriamento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico Tropical, especialmente na região central e centro-leste, incluindo as costas do Equador e do Peru, e que pode durar meses ou anos, afetando significativamente o clima global, incluindo o Brasil. Em nota técnica, estudos apontam que, na porção leste de São Paulo e litoral sul do Rio de Janeiro, especialmente nas áreas costeiras, são esperados entre cinco e oito eventos de chuva acima de 50 mm em 24 horas entre setembro de 2024 e fevereiro de 2025. As chuvas serão mais intensas no litoral sul de São Paulo, Baixada Santista e Costa Verde no Rio de Janeiro. Esses locais, incluindo Angra dos Reis, são extremamente vulneráveis a deslizamentos de terra e outros desastres geo-hidrológicos, exigindo atenção especial devido ao aumento da frequência de chuvas intensas e os consequentes riscos para a população. Em suma, eventuais calamidades provocadas por chuvas acima da média estão previstas.

O conceito de segurança da população adotado por governos e organismos internacionais, como a ONU (Organização das Nações Unidas), vai muito além da ausência de conflitos e violência contra o cidadão, abrangendo a proteção contra uma ampla gama de riscos e ameaças. Isso inclui mudanças climáticas, desastres naturais e tecnológicos, doenças e pobreza. Recentemente, inundações no Rio Grande do Sul têm devastado propriedades e deixado muitos desabrigados, enquanto estiagens severas em outros Estados brasileiros resultam em perdas agrícolas significativas. No Pantanal, incêndios destroem vastas áreas de biodiversidade, ameaçando a fauna e destruindo não apenas os meios de subsistência das comunidades locais, mas também a economia. Por sua magnitude de destruição social, econômica e ambiental, esses eventos exigem ações urgentes para a preparação e resposta a emergências, além de apoio à recuperação pós-desastre.

Ainda de acordo com o conceito de segurança da população, as mudanças climáticas manifestam-se visivelmente através de secas prolongadas que devastam colheitas, resultando em insegurança alimentar e perda de meios de subsistência para agricultores. Inundações frequentes causam destruição de infraestrutura, como estradas e pontes, e danificam habitações, levando ao deslocamento de comunidades inteiras. Essas condições extremas aumentam a incidência de doenças transmitidas pela água e comprometem o acesso à água potável. A perda de vidas em desastres naturais sublinha a urgência de ações governamentais para promover resiliência e adaptação, como a construção de infraestruturas mais robustas, sistemas de alerta precoce e práticas agrícolas sustentáveis. A pobreza e a desigualdade social, tão presentes no cotidiano de nossas cidades e áreas rurais, são grandes fatores de insegurança. A busca pela erradicação da pobreza por meio do acesso a serviços básicos, como educação e saúde, e a promoção do desenvolvimento sustentável e dos direitos humanos é fundamental para garantir a segurança das pessoas. Nas cidades, a pobreza se manifesta visivelmente nas favelas e em bairros autoproduzidos, onde a falta de saneamento, educação e saúde resulta em moradias inadequadas, sujeitas a riscos diversos e vulnerabilidade a condições climáticas extremas. No campo, as desigualdades se refletem em pequenas propriedades rurais sem acesso a tecnologias agrícolas modernas, mercados e recursos financeiros, limitando a produção e perpetuando a insegurança alimentar, ou ainda, a fome. A falta de serviços básicos, como água potável e atendimento médico, acentua essas dificuldades, aumentando a migração para áreas urbanas em busca de melhores oportunidades.

A magnitude devastadora dos eventos climáticos extremos em várias áreas de nossas vidas exige uma resposta imediata e abrangente dos governos para garantir a segurança da população nas cidades e áreas rurais. Eventos como secas prolongadas, inundações frequentes e desastres naturais impactam significativamente a vida das pessoas, causando perdas econômicas, destruição de infraestrutura e deslocamentos populacionais. Para minimizar os danos e salvar vidas, é essencial que os governos implementem ações urgentes de preparação e resposta a emergências, desenvolvendo sistemas de alerta precoce, infraestrutura resiliente e práticas agrícolas sustentáveis. A busca pela erradicação da pobreza, através do acesso a serviços básicos como educação e saúde, e a promoção do desenvolvimento sustentável e dos direitos humanos são fundamentais para garantir a segurança das pessoas. Além disso, a resposta eficaz às calamidades inclui apoio à recuperação pós-desastre para reconstruir comunidades e restaurar meios de subsistência. 

A pergunta que se impõe é: como os governos estão se preparando para garantir a segurança da população e evitar mortes previsíveis e perdas materiais? Futuros desastres provocados por extremos climáticos são previsíveis, e dados científicos, apesar da constante falta de verbas destinadas à pesquisa, não faltam, incluindo agências públicas brasileiras que se dedicam à pesquisa do tema. Quando governos procrastinam ou abandonam a população à própria sorte, esperando que o acaso resolva eventuais problemas ou delegando a “aquietação” do futuro climático à providência divina, perdem a oportunidade de agir de forma proativa e são, sim, responsáveis por danos e mortes anteriormente “anunciados”, por assim dizer. Passou da hora de governos anteciparem as futuras calamidades e planejarem a segurança da população de maneira eficaz e integrada.

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*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

Não adianta só fazer planos, planos e mais planos, é preciso reconstruir a biodiversidade nas cidades

Nas 14 primeiras semanas deste ano, Brasil atingiu 3,1 milhões de casos prováveis de dengue e 1.292 mortes; inércia das autoridades, visão limitada do problema e a busca desenfreada por lucros criam um cenário caótico

JOSE LUCENA/THENEWS2/ESTADÃO CONTEÚDOFumacê para combate ao mosquito transmissor da dengue no entorno do Hospital Estadual Alberto Torres, em São GonçaloAção de conscientização para o combate à dengue em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro

Matéria recente publicada pelo Worl Economic Forum, intitulada Every Decision is a Climate Decision (Cada Decisão é uma Decisão Climática) destaca uma série de “anormalidades globais” que vem ocorrendo nos últimos anos em todo o planeta. Inundações devastadoras, ondas de calor brutais, secas prolongadas e incêndios florestais descontrolados marcaram o ano de 2023 e tornaram-se cada vez mais frequentes e intensos, causando perdas humanas, danos materiais e impactos socioeconômicos devastadores. Consequência direta da perda de biodiversidade provocada pela interferência humana, o desequilíbrio ambiental gera impactos materiais e riscos diversos à vida e saúde das pessoas. Proteger todas as espécies de seres vivos do planeta ou, ainda, a biodiversidade terrestre, especialmente em áreas urbanas, é uma tarefa urgente, de caráter global, e que requer ação imediata de governos, empresas e pessoas. O Conselho Nacional da Saúde (CNS) apresentou estatísticas, em publicação recente, informando que, em 2024, o Brasil enfrentará a pior epidemia de dengue dos últimos anos. E dengue pode matar.

Dados divulgados pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) apontam que o Brasil atingiu 3,1 milhões de casos prováveis de dengue nas 14 primeiras semanas deste ano e 1.292 mortes causadas pela transmissão do vírus, enquanto 1.875 estão sob investigação. Embora complexa, existe uma relação entre a destruição da biodiversidade urbana e as alterações climáticas. Com o aumento da temperatura e eventos climáticos extremos, como chuvas intensas, criam-se condições mais favoráveis para a reprodução dos mosquitos. O crescimento urbano desordenado, com ausência de planejamento adequado, resulta em precariedade na provisão de infraestrutura de saneamento básico, levando à formação de áreas propícias à proliferação, como locais com acúmulo de lixo e falta de drenagem adequada. Tratar futuros surtos e epidemias que ocorrem nas cidades demanda bem mais do que tentar eliminar o foco do mosquito transmissor por meio de campanhas de educação da população e fiscalização. Embora a educação seja crucial para conscientizar as pessoas sobre sua responsabilidade na redução da proliferação do mosquito, é igualmente vital reconsiderar a importância da reconstrução da biodiversidade nas cidades.

Planos, planos e mais planos voltados a soluções pontuais proliferam em guichês e secretarias municipais, como se a simples redação de seu texto tivesse o poder de garantir os resultados e benefícios planejados. Se por um lado sua existência apresenta um esforço dos agentes públicos para alinhar-se ao cumprimento das metas da Agenda 2030, por outro, a descarbonização urbana enfrenta um hiato gritante entre a intenção e a ação. A inércia das autoridades, a visão limitada do problema e a busca desenfreada por lucros imediatos por alguns setores criam um cenário caótico, onde a efetividade das políticas e ações urbanas se perdem em meio à burocracia e à falta de compromisso, dificultando respostas rápidas e eficazes às mudanças socioambientais. A falta de coordenação entre diferentes órgãos, com conflitos de interesse e duplicação de esforços, gera atrasos, desperdício de recursos e desigualdade na distribuição de investimentos. É urgente a adoção de uma abordagem integrada e colaborativa, envolvendo todas as partes interessadas, para garantir a preservação da biodiversidade urbana.

É neste contexto que o Índice de Biodiversidade de Cingapura (SI) surge como uma ferramenta complexa que, ao abranger 28 categorias de análise, pode, por meio da mensuração e monitoramento, não apenas fornecer uma visão abrangente do estado da biodiversidade, mas também, colaborar na formulação de planos e políticas urbanas eficazes, servindo como base sólida para decisões estratégicas e ações direcionadas por meio da coleta, análise e utilização de dados. Como medir e monitorar a eficácia do que vem sendo feito por governos para recuperar a biodiversidade urbana e melhorar a capacidade de uma cidade de resistir, se adaptar e se recuperar dos impactos ambientais provocados pelas mudanças climáticas? Desde a adaptação às mudanças climáticas até a resiliência urbana, passando pela gestão de recursos naturais e o controle de espécies invasoras, é necessário construir métricas e, principalmente, dados capazes de fornecer um panorama detalhado das estratégias e políticas implementadas para melhorar as condições ambientais e climáticas, com o objetivo de proteger a saúde e a vida dos cidadãos. Isso colaboraria para a construção de um futuro no qual surtos e epidemias de doenças geradas por insetos, por exemplo, sejam reduzidos significativamente.

Ao examinar questões como participação pública, educação ambiental e infraestrutura verde, o índice busca promover a colaboração entre entidades públicas, privadas e da sociedade civil, visando garantir um ambiente urbano mais sustentável e resiliente para as gerações futuras. Além das categorias de análise mencionadas anteriormente, o índice de biodiversidade urbana também aborda temas como a conservação de habitats naturais, a proteção de corredores ecológicos, a promoção da agricultura urbana, a preservação de áreas de recarga hídrica e a mitigação dos impactos da urbanização na fauna e flora nativas. Essas adições ampliam ainda mais a compreensão e a abordagem holística para lidar com os desafios da biodiversidade nas cidades, incentivando a implementação de políticas e práticas mais eficazes para a proteção do meio ambiente urbano. As cidades, apesar de ocuparem apenas 3% do território, concentram grande parte da população e do consumo, excedendo os limites do planeta. A reorganização do planejamento ambiental nas cidades com foco na recuperação da biodiversidade associado à adoção de métricas para a avaliação e monitoramento do impacto das estratégias adotadas por governos, sociedade e setor econômico, e sua eficácia frente às questões de resiliência urbana, são fundamentais para a garantia um futuro sustentável para todos.

Arborização urbana, centros de resfriamento e mais: confira estratégias adotadas para minimizar as ondas de calor

Necessidade de alinhar políticas públicas e sensibilizar a população torna-se ainda mais evidente diante da urgência climática

Coluna originalmente publicada para a Jovem Pan News

CRISTINA QUICLER / AFP

O crescente desafio de minimizar os efeitos das ondas de calor sobre a saúde física e mental da população nas cidades tem levado diversos gestores públicos a adotar estratégias para a criação de ambientes urbanos mais frescos. Conhecida como infraestrutura de sombreamento, sua abordagem tem sido capaz de resfriar áreas urbanas e proteger as pessoas dos efeitos do calor extremo por meio de ações complexas.

Mais da metade da população mundial mora em cidades e, aqui no Brasil, a porcentagem supera os 80%. Dados associados aos efeitos deste “calorão” e ventos fortes com mais de 100 km/h, caso da cidade onde resido, São Paulo, são previsíveis e merecem prontidão dos gestores municipais. Culpar as árvores ou afirmar que a situação é excepcional apenas reitera o que a maioria dos cidadãos já sabe: gestores e demais atores políticos, muitos deles eleitos pela população, incapazes de apontar caminhos para solucionar a curto, médio e longo prazo os efeitos que os extremos climáticos vem provocando nas cidades. Blá, Blá e Blá, como diria a jovem ativista Greta Thunberg ao se referir aos discursos e falas de governos e seus representantes quanto às ações práticas para alcançar as metas propostas pela Agenda 2030.

Estruturas sombreadas em parques e praças: combinando treliças ornamentais com vegetação, oferecem proteção contra a exposição direta ao sol, especialmente durante períodos de altas temperaturas. Em locais movimentados, essas instalações fixas ou temporárias, muitas delas consideradas “obras de arte escultóricas”, não só proporcionam alívio térmico, mas também se integram esteticamente, criando ambientes urbanos mais agradáveis e sustentáveis, refletindo o compromisso da cidade com o bem-estar da população.

Telhados e paredes verdes: implantação extensiva de telhados e paredes verdes em prédios e equipamentos públicos, reduzindo a absorção de calor e oferecendo áreas sombreadas.

Arborização urbana: Melbourne, na Austrália, foca em aumentar a vegetação nas áreas urbanas, criando sombras naturais. Recentemente, a ministra do Meio Ambiente, Soipan Tuya (Kenya), anunciou a meta de plantio de 10O milhões de árvores com o auxílio da população no feriado local de 13 de novembro. Sua meta, mais ambiciosa, prevê o plantio de 15 bilhões de árvores nos próximos 10 anos e tem por objetivo

Centros de resfriamento: Diversas cidades implementam Centros de Resfriamento durante ondas de calor para proteger os cidadãos. A cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos, abriu os saguões de entrada e ambientes de estar de bibliotecas, centros comunitários, hospitais, escolas e vários edifícios públicos para que a população possa abrigar-se em dias de calor. Melbourne, na Austrália, com Centros de Resfriamento em locais estratégicos comumente instalados em edifícios e equipamentos públicos. Já Tóquio, no Japão, adotou uma política pública para enfrentar o calor extremo por meio da criação de refúgios refrigerados chamados de Centros de resfriamento (tradução livre) em locais estratégicos, como shoppings e ginásios particulares durante períodos de altas temperaturas.

Distribuição de água e informação: Cidades implementam ações proativas durante ondas de calor, como a distribuição gratuita de água em áreas públicas proporcionando acesso fácil à hidratação. Paralelamente, campanhas informativas são conduzidas para educar a população sobre práticas seguras durante condições climáticas extremas. Iniciativas incluem orientações sobre manter-se hidratado e evitar atividades extenuantes ao ar livre, promovendo a conscientização e a prevenção de problemas de saúde relacionados ao calor.

Transporte público refrigerado como refúgio: Os meios de transporte público, como ônibus, metrôs e trens são tratados como refúgios durante ondas de calor, cabendo às autoridades a orientação ao uso desses serviços e locais para permanecer em ambientes climatizados.

Assistência a grupos vulneráveis: equipes de assistência social realizam visitas a comunidades de baixa renda, oferecendo suporte e distribuindo recursos como água e protetores solares. Da mesma forma, em Tóquio, iniciativas focam em garantir que idosos e demais grupos vulneráveis recebam atenção especial durante períodos de calor extremo, fornecendo locais refrigerados e assistência direta.

Projetos de infraestrutura urbana resiliente: algumas cidades, como Melbourne, na Austrália, têm investido em projetos de infraestrutura urbana que visam tornar as áreas urbanas mais resilientes ao calor, incluindo a criação de espaços verdes e pavimentação reflexiva, resultando na redução do calor urbano e melhoria do conforto térmico. Em Phoenix, nos EUA, a cidade investe no desenvolvimento de parques urbanos densamente arborizados e no aumento da vegetação intraurbana, com impacto direto na mitigação das ilhas de calor e na criação de espaços mais frescos. Já em Barcelona (Espanha), um projeto de renovação urbana focado na produção de mais áreas verdes contribui para o aumento da resiliência ao calor e a promoção de ambientes mais agradáveis e frescos.

Regulamentações de edifícios: cidades ao redor do mundo estão implementando regulamentações de edifícios para enfrentar o calor extremo. Exemplos incluem Sydney (Austrália), que estabeleceu padrões para eficiência energética e design sustentável em construções. Da mesma forma, Portland, nos EUA, adota códigos de construção que promovem técnicas de resfriamento passivo e materiais refletivos em edifícios que visam melhorar a eficiência energética e proporcionar ambientes internos mais frescos, contribuindo para a resiliência das cidades em face das crescentes temperaturas.

Sistemas de água urbana: em Singapura, a utilização de lagos e corpos d’água integrados ao design urbano contribui para resfriar o ambiente.

Pavimentos reflexivos ou ainda “pavimentos frescos”: trata-se de uma tecnologia desenvolvida para atenuar as altas temperaturas em áreas urbanas, pois empregam materiais especiais que refletem a luz solar e absorvem menos calor. Sua proposta é minimizar a retenção de calor nas superfícies urbanas, combatendo a formação de ilhas de calor. Além disso, ao melhorar o conforto térmico nas ruas, o “pavimento fresco” contribui para ambientes urbanos mais agradáveis, fomentando práticas sustentáveis na urbanização.

Ciclovias arborizadas: Amsterdã (Holanda) arborizou, ao longo dos últimos anos, suas ciclovias, para proteger os ciclistas do calor excessivo.

Sistemas de nebulização: Lisboa (Portugal) adotou sistemas de nebulização espalhados por toda a cidade para resfriamento temporário.

Alertas de onda de calor: A cidade utiliza sistemas avançados de monitoramento climático para emitir alertas de onda de calor. Esses alertas são divulgados antecipadamente para que os residentes estejam cientes dos períodos de calor extremo. No Brasil, o sistema já é adotado, mas, embora anunciados pela Defesa Civil e outros órgãos públicos, a divulgação de alertas de calor extremo que são enviados antecipadamente aos residentes por meio de mensagem de celular alcançam os cidadãos que dispõe do aparelho e que sejam capazes de pagar por planos de internet para celular.

O planejamento estratégico de ações a curto prazo desempenha um papel crucial no enfrentamento dos desafios climáticos, especialmente nas cidades vulneráveis às ondas de calor. A necessidade de alinhar políticas públicas, promover investimentos em infraestrutura resiliente e sensibilizar a população torna-se ainda mais evidente diante da urgência climática. Os atores públicos, ao considerarem ações imediatas, podem não apenas proteger as comunidades vulneráveis, mas também pavimentar o caminho para cidades mais sustentáveis e adaptadas ao clima no longo prazo.

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Se você acha que o final de semana foi quente, espere pelos próximos dias

O calor que estamos sentindo e as inundações provocadas pelas chuvas fortes são consequências do desequilíbrio causado pela forma como estamos modificando os recursos e os sistemas naturais do planeta

  • Por Helena Degreas
  • 02/02/2021 14h22 – Atualizado em 02/02/2021 14h48

Foto: LECO VIANA/THENEWS2/ESTADÃO CONTEÚDO 01/01/2021 – 17:53Aumento da temperatura do planeta vem se intensificando desde a década de 1980

Nos últimos dias, os moradores das cidades brasileiras vêm sentindo os efeitos das altas temperaturas. Dias muito quentes, abafados, seguidos de chuvas muito fortes que alagam toda a cidade, causando riscos à vida de todos. Os dias ensolarados do verão vêm acompanhados de calor extremo e sensação térmica superior à temperatura registrada pelos termômetros, dificultando as atividades diárias da população. O aumento da temperatura do planeta vem se intensificando desde a década de 1980. Centenas de cientistas que compõem o Painel Intergovernamental para a Mudança de Clima (IPCC) apresentaram em 2018 um relatório especial no qual propõem que todos os países que se comprometeram com o Acordo de Paris (incluindo o Brasil), adotem como meta limitar o aumento da temperatura global entre 1,5˚C e 2˚C. Parece pouca diferença, mas no dia a dia das pessoas o resultado é catastrófico, pois causa destruição, mortes, perdas materiais e sofrimento a milhões de pessoas em todo o mundo.

O calor que estamos sentindo nos últimos dias e as inundações provocadas pelas chuvas fortes são consequências do desequilíbrio causado pela forma como estamos modificando os recursos e os sistemas naturais do planeta. O desafio que se coloca é o da necessidade de mudança de paradigma no planejamento das cidades: como fazer isso unindo aspectos ecossistêmicos, técnicos, sociais e econômicos? É possível construir cidades melhores com energias renováveis, reflorestamentos urbanos e implantação de áreas permeáveis ajardinadas para absorver a água das chuvas e sombrear calçadas e praças, reduzindo a temperatura nos espaços públicos e evitando inundações? Existem vários exemplos de prefeitos em cidades espalhadas pelo mundo que já estão colocando em prática ações concretas e criativas para minimizar os efeitos do clima como temperaturas altas e inundações.

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Recentemente, a prefeitura cidade de Los Angeles nos Estados Unidos criou o programa de StreetsLA que pretende, num período de 5 anos, reformular o espaço público tornando-o resiliente aos eventos climáticos por meio de ações simples, como o plantio de milhares de árvores ao longo das calçadas, praças e parques sombreando a cidade. A prefeitura da cidade de Chicago criou incentivos para a implantação de telhados verdes que, além de colaborarem no conforto térmico e acústico dos edifícios, também reduzem os impactos das ilhas de calor nas cidades. Por sua vez, a cidade de Hong Kong levou o conceito de cidades-esponja ao extremo: pretende absorver e armazenar até 70% da água pluvial em 20% da área urbana. O governo chinês considera inadmissível que um líquido que “cai de graça do céu” seja desperdiçado com inundações e gere mortes e destruição. O objetivo do programa é: menos asfalto, menos concreto e mais lagos, mais parques. Está construindo parques alagáveis, telhados verdes, calçamentos permeáveis e praças-piscina. O que estas cidades cujos exemplos citei têm em comum? A vontade política para realizar obras comprometidas com as questões ambientais globais. A capacidade de compreender que estamos todos no mesmo planeta e, aquilo que afeta um país, afetam todos os demais. A disseminação de vírus como dengue, zika, chikungunya e, mais recentemente, o coronavírus, que vem matando milhares de pessoas só no Brasil, está diretamente relacionado às questões ambientais de âmbito global, por exemplo.

São gestores públicos solidários à causa – prefeitos, governadores e presidentes que têm o compromisso de reduzir a temperatura global, os riscos que afetam a vida e a economia das populações, em especial, a dos países mais vulneráveis. Escrevi anteriormente que o Brasil tem leis, normas, manuais, regulações ambientais exemplares e que foram, no passado, referências para o desenvolvimento de políticas ambientais para diversos países. Alguns planos diretores municipais, como no caso de São Paulo, tem expressas desde 2014 as diretrizes de planejamento urbano que devem ser adotadas para que a cidade seja resiliente ao clima. Prefeito Bruno Covas: melhore a qualidade de suas ações ambientais. Não se resolvem questões climáticas, chuvas e altas temperaturas com a construção de piscinões apenas. Se ao menos os piscinões fossem equipamentos públicos projetados para serem alagáveis, como o Parque alagável Yanweizhou, na cidade de Jinhua, na China, a solução poderia seria mais adequada para uma cidade do tamanho e da importância econômica de São Paulo. É preciso um discurso menos conservador e planos mais abrangentes para tratar a questão. Conhecimento para realizar as ações necessárias o corpo técnico da prefeitura de São Paulo tem, e de sobra. Falta vontade política para disponibilizar recursos financeiros para ações que podem evitar os impactos negativos que já vem ocorrendo no dia a dia da população.

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Inundações são previsíveis e devem ser tratadas pelos prefeitos como riscos à vida da população

É possível mapear possíveis desastres causados pelas chuvas de verão e, assim, evitar que pessoas percam a casa, os móveis ou até a vida

  • Por Helena Degreas
  • 05/01/2021 08h00 – Atualizado em 07/01/2021 14h04

Helena Degreas/Jovem PanBuraco de dois metros de profundidade, provavelmente causado pela chuva, recebe sinalização improvisada para não machucar os mais desatentos

Até que “as águas de março fechem o verão”, muitos lares, comércios, bens materiais e vidas serão perdidos como consequência das chuvas torrenciais que assolam a cidade. É impressionante ler, ano após ano, as mesmas manchetes que tratam dos estragos provocados pelas tempestades. Inundaçõesenchentesdeslizamentosquedas de árvores e afundamentos de asfalto ocasionados por rompimentos de galerias de águas pluviais ainda são tratados como “desastres naturais”, em especial, quando os governos locais falham no gerenciamento dos riscos decorrentes dos efeitos relacionados aos extremos climáticos. Reitero que não são desastres ocasionados apenas por fenômenos naturais extremos: são decorrentes da falta de previsão de nossos gestores públicos dos riscos aos quais os cidadãos estão expostos nesta época do ano.https://53b1b23af142c0c538a0845591c7743b.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

A imagem estampada na coluna desta semana é só mais uma das várias experiências vivenciadas por quem mora nas capitais brasileiras. O diâmetro do buraco é até singelo, mas a profundidade de cerca de 2 metros permite que uma pessoa distraída com seu celular possa ser engolida por ele. Provavelmente, a chuva torrencial sobrecarregou a rede de águas pluviais e o asfalto cedeu. Tentando solucionar a questão, o motorista do ponto de taxi em frente colocou um galho no local, apontando ao prefeito, involuntariamente, que a permeabilização da cidade se faz necessária e que esta é uma das várias ações de baixo custo que podem ser adotadas para melhorar a absorção das águas em diversos pontos da cidade: a substituição do asfalto por grama em alguns casos.PUBLICIDADE

Causou-me estranheza, portanto, ler a plataforma de governo do prefeito reeleito Bruno Covas. Um dos destaques tratava da construção de novos piscinões, que, apesar de necessários, não resolvem as consequências anteriormente citadas. Estas obras são desenvolvidas para conter as águas das chuvas que irão ocupar ruas e avenidas da cidade, evitando inundações, enchentes e prejuízos materiais em alguns pontos. Trata-se de uma ação que está longe de ser a única solução para as enchentes. Não previnem o problema, sempre haverá a necessidade de construção de mais piscinões. Como evitar isso? Antecipar, gerenciar e reduzir os riscos de desastres são atribuições dos gestores locais, pois eles devem atuar criando sistemas de alerta e estabelecendo estruturas específicas para o gerenciamento de crises como essas. Essas ocorrências são previsíveis e encontram-se inclusive mapeadas: uma simples busca na plataforma GeoSampa localiza desde quedas de árvores até deslizamentos e inundações ocorridas na cidade.

Dois excelentes documentos produzidos por secretarias da prefeitura paulistana nos últimos anos podem ser utilizados para a melhoria da plataforma de governo, colocando a questão das inundações numa discussão contemporânea, mais ampla, envolvendo assuntos que compõem a agenda urbana internacional como a gestão de riscos advindos dos extremos climáticos. O primeiro deles é o Manual de Desenho Urbano e Obras Viárias, que, em um de seus capítulos, destaca a importância da constituição de uma rede de infraestrutura verde (permeabilidade e vegetação) e azul (águas urbanas), abarcando os sistemas naturais também abrigados pelo espaço viário, como arborização, parques lineares, sistemas de biorretenção e paisagismo. Vagas verdes e jardins de chuva em calçadas e áreas residuais de sistemas viários são alguns exemplos. O outro é o Plano Municipal de Áreas Protegidas, Áreas Verdes e Espaços Livres, cuja consulta pública foi recentemente concluída e define uma política de gestão para a provisão de áreas verdes e de proteção do patrimônio ambiental do município de São Paulo. Os dois documentos, elaborados por técnicos municipais após consulta pública, contribuem para o planejamento das consequências advindas dos extremos climáticos aos quais pessoas e bens estão expostos em função do aumento da temperatura no planeta. 

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A revisão de atribuições, responsabilidades e a alocação de recursos para a implementação de diretrizes apresentadas nos dois documentos ampliará a capacidade de resiliência da cidade de São Paulo, restaurando suas estruturas e funções básicas, evitando com isso os riscos à população. É importante que gestores públicos locais incluam o conhecimento das vulnerabilidades existentes e os riscos associados à ocorrência de eventos extremos climáticas ao dia a dia da gestão pública, bem como ao planejamento das cidades, para o bem do cidadão.

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