Veículos de grande porte devem pagar uma taxa adicional para estacionar em áreas centrais da cidade?

Coluna publicada na Jovem Pan News em 10.04.2024

Fonte: Jovem Pan News

Recentemente, em Oxford, na Inglaterra, uma medida polêmica foi implementada, propondo ajustar as taxas de estacionamento rotativo nas áreas centrais da cidade de acordo com o tamanho do veículo, afetando especialmente os proprietários de SUVs (Sport Utility Vehicle) e outros veículos de grande porte.

Essa iniciativa segue o exemplo de Paris, onde a maioria dos eleitores apoiou o aumento dos preços de estacionamento para veículos maiores nas Zonas de Emissões Baixas. Além das questões financeiras, a justificativa se estende ao fato de que veículos maiores ocupam mais espaço, contribuem para o congestionamento urbano, têm maior potencial de causar danos e mortes em colisões, geram mais desgaste nas ruas, poluem mais o ar (quando não elétricos) e aumentam o ruído, afetando a qualidade de vida de todos os cidadãos. Em Londres, por sua vez, foi implementada em 2019 a Ultra-Low Emission Zone (Ulez), estabelecida pela Autoridade de Transporte de Londres (TfL) para melhorar a qualidade do ar, reduzindo as emissões de poluentes dos veículos que circulam na área designada. Esta medida segue os critérios das normas EURO da União Europeia, que definem limites de emissão de poluentes para veículos novos, com o objetivo de promover a produção de veículos com o uso de tecnologias mais limpas. Desde os anos 90, essas normas têm se tornado cada vez mais rigorosas, abordando diversos tipos de poluentes, como óxidos de nitrogênio, partículas, hidrocarbonetos e monóxido de carbono. A Euro VI, introduzida em 2013 para veículos pesados e 2014 para veículos leves, estabelece limites ainda mais baixos, estimulando tecnologias avançadas de controle de emissões. Essas medidas não apenas contribuem para a redução da poluição, mas também impulsionam a inovação em direção a uma mobilidade mais sustentável, protegendo a saúde pública em toda a Europa. O importante é que

Diversos exemplos inspiradores ao redor do mundo ilustram o compromisso global de gestores públicos, empresas e populações em promover cidades mais limpas e saudáveis, alinhadas com as metas da AGENDA 2030. Em Madrid (Espanha), uma Área de Emissões Baixas foi estabelecida em 2018, proibindo a entrada de veículos mais poluentes nas áreas centrais. Na Cidade do México (México), uma Zona de Restrição Veicular foi implementada em 1989, restringindo a circulação de veículos em dias específicos com base no número da placa. Em Milão (Itália), a adoção de uma Zona de Tráfego Limitado em 2008 limitou a entrada de veículos em áreas históricas durante certos horários. Em Oslo, Noruega, uma área de restrição de emissões foi introduzida em 2017, proibindo a entrada de veículos a diesel mais antigos em algumas áreas. Estocolmo (Suécia), optou por uma taxa de congestionamento em 2007, cobrando dos motoristas para entrar na área central da cidade durante os horários de pico. Enquanto isso, Pequim (China), enfrenta a poluição do ar com zonas de restrição de emissões e rodízio de veículos, com medidas mais rigorosas em períodos de alta poluição.

Limitar o número de vagas de estacionamento disponíveis para SUVs e demais veículos de grande porte em áreas públicas pode ser uma medida eficaz para priorizar espaços para veículos menores e modos de transporte mais sustentáveis, como bicicletas e transporte público reduzindo as emissões de CO2 associadas ao transporte, mas também promove uma distribuição mais equitativa do espaço urbano, beneficiando toda a comunidade.

Os impactos positivos dessas políticas na melhoria climática e na redução de CO2 nas áreas urbanas são significativos. Num primeiro momento, a redução do consumo de combustíveis fósseis decorrente da menor circulação de SUVs nas ruas leva a uma diminuição das emissões de gases de efeito estufa, contribuindo para conter as mudanças climáticas. Além disso, menos veículos de grande porte nas vias resultam em menos congestionamento, o que reduz o tempo que os carros ficam parados e emitindo poluentes. A transformação de vagas de estacionamento em áreas verdes e permeáveis como vem ocorrendo nos últimos 10 anos em Buenos Aires (Argentina), contribui não apenas para captar as águas pluviais, sombrear as calçadas, prover novos locais para descanso, reduzir a sensação térmica pela requalificação de áreas públicas, mas também para promover a biodiversidade urbana e alcançar as metas para descarbonização urbana ou, ainda, colaborar no processo de redução das emissões de carbono nas áreas urbanas, visando mitigar as mudanças climáticas.

Para que a proposta de taxação diferenciada de estacionamento e circulação de veículos grandes, como SUVs, obtenha sucesso, é essencial abordar a possível oposição da indústria automobilística. Diálogo e medidas para mitigar impactos na cadeia produtiva são cruciais, incluindo incentivos à produção de veículos mais eficientes, programas de reciclagem e criação de novas oportunidades de emprego como estratégias viáveis.

As iniciativas ao redor do mundo refletem um esforço global para criar cidades mais limpas e saudáveis para todos. A implementação de políticas que priorizam o espaço urbano de forma equitativa, como a taxação diferenciada de estacionamento para veículos grandes, como SUVs, e a intensificação da fiscalização visando o cumprimento das normas ambientais, são passos importantes nessa direção. Essas medidas não apenas contribuem para a redução das emissões de CO2, melhoria da qualidade do ar e colaboram no combate às mudanças climáticas, mas, também, geram receita para investimentos em infraestrutura urbana e transporte sustentável, promovendo uma distribuição mais justa do espaço urbano e beneficiando, portanto, toda a população.

Quais são os desafios e oportunidades que nos aguardam em 2024 na busca por um desenvolvimento urbano sustentável?

Sustentabilidade, resiliência climática e inclusão social são alguns dos temas que ocuparão as manchetes dos principais meios de comunicação no ano recém-iniciado

Por Helena Degrea 06/01/2024 09h00 para a Jovem Pan News (texto original)

EDI SOUSA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO – 03/01/2024Pedestres enfrentam a primeira chuva de verão do ano de 2024, no fim de tarde desta quarta-feira (3), na região central de São Paulo

Planejadores urbanos e gestores públicos devem preparar cidades para enfrentar e mitigar impactos dos extremos climáticos

As discussões previstas na Agenda Urbana Internacional para o ano de 2024 (e que se estenderão para a próxima década) apontam para cinco temas que ocuparão as manchetes dos principais meios de comunicação e que visam o planejamento de cidades mais sustentáveis, inclusivas e resilientes. Espera-se de gestores e técnicos públicos: 

Sustentabilidade urbana

O crescimento inevitável das áreas urbanas destaca a imperatividade dos governos investirem no desenvolvimento de políticas públicas e estratégias com ações que visam causar o menor dano possível aos ecossistemas, recursos naturais, biodiversidade e à qualidade do ar, água e solo. Ao promover políticas e práticas ecoeficientes, governos estimulam ambientes urbanos ecologicamente equilibrados e saudáveis. Investir em energias renováveis, desenvolver sistemas de transporte público integrado com a inclusão dos modais ativos e adotar políticas de gestão inteligente de resíduos são algumas das medidas concretas nesse caminho. Essas iniciativas não apenas respondem ao desafio ambiental, mas também contribuem para o desenvolvimento sustentável das áreas urbanas, garantindo uma qualidade de vida mais elevada para seus habitantes.

Resiliência climática e adaptação

Com as preocupações crescentes em relação aos impactos causados pelas mudanças climáticas que recaem sobre a população, as cidades (seus planejadores urbanos e gestores públicos) devem se preparar para enfrentar e mitigar impactos adversos. Embora afetem todos os cidadãos, os impactos recaem, sobremaneira, sobre a população mais pobre que reside em áreas distantes dos centros e cuja infraestrutura é, comumente, precária. Adaptação dos sistemas de drenagem e gestão de águas pluviais, infraestrutura de abastecimento de água e saneamento, transporte público e mobilidade urbana, parques e áreas verdes urbanas, estruturas costeiras e portuárias, redes elétricas e de energia deverá sofrer adaptações para sua eficiência e eficácia para fortalecer a resiliência das cidades diante dos desafios climáticos emergentes, garantindo a segurança e qualidade de vida dos habitantes urbanos.

Inovação tecnológica e cidades inteligentes

Avanços tecnológicos oferecem a oportunidade única de transformar as cidades em ecossistemas inteligentes a partir da integração de tecnologias emergentes, como a Internet das Coisas (IoT) e inteligência artificial, otimizando serviços urbanos e melhorando a qualidade de vida dos cidadãos. Aplicações como gestão inteligente de tráfego e transporte, monitoramento ambiental, e planejamento urbano baseado em dados, considerando padrões climáticos futuros, são algumas das diversas possibilidades que melhoram a qualidade de vida. O uso inteligente de água com integração de sensores para monitoramento do consumo em tempo real, sistemas de irrigação adaptáveis às condições climáticas, gestão inteligente de resíduos por meio da implementação de sistemas de coleta de lixo que otimizam rotas com base na demanda, reduzem a emissão de poluentes. A mobilidade sustentável e sistemas de transporte, quando conectados e interativos, oferecem informações por meio de aplicativos e plataformas em tempo real sobre transporte público, permitindo aos cidadãos planejar rotas eficientes e reduzir a dependência de veículos individuais, contribuindo para a redução das emissões de carbono. Outo exemplo é a gestão eficiente de redes de energia com a implementação de redes elétricas inteligentes que ajustam automaticamente a distribuição de energia com base nas demandas sazonais e das condições climáticas locais. E, por fim, sensores urbanos para monitoramento ambiental para identificar padrões de poluição e alertar sobre eventos climáticos extremos.

Inclusão social e equidade

Diante das desigualdades sociais evidentes em muitas áreas urbanas, os próximos anos exigirão um esforço conjunto entre gestores e técnicos públicos dos três entes federativos, empresas e população para garantir o acesso universal à moradia, à infraestrutura urbana, equipamentos e serviços públicos e o fortalecimentos dos instrumentos adequados para a participação de grupos sociais diversos na tomada de decisões sobre a gestão das intervenções necessárias à realidade local. O urbanismo local, que afeta o cotidiano das pessoas, precisa se integrar ao planejamento urbano generalista, que muitas vezes ignora as necessidades cotidianas. Planos de bairro e planos de rua precisar ingressar na prática de gestão urbana municipal. 

Governança urbana participativa

A participação cidadã na tomada de decisões urbanas é crucial para assegurar representação diversificada e transparente. O desafio é fortalecer instituições governamentais urbanas para garantir governança eficaz, transparente e responsável. Estimular a participação cidadã, fortalecer instituições de controle social e garantir a transparência governamental são passos fundamentais nesse percurso por meio do desenvolvimento de plataformas online e aplicativos que permitem aos cidadãos relatar problemas ambientais em tempo real, como pontos de alagamento ou áreas com poluição do ar, por exemplo.

Complexos e interligados, os temas voltados ao cumprimento das metas presentes na Agenda 2030 refletem a busca por soluções que permitam que as cidades prosperem diante de desafios globais. Ao adotar estratégias ambientais, fomentar inclusão social e garantir transparência e participação cidadã na governança pública, as cidades fortalecem a resiliência e constroem comunidades sustentáveis. A busca pela sustentabilidade urbana não apenas promove eficiência e resiliência, mas também compromete-se a distribuir equitativamente os benefícios, trilhando o caminho de um futuro mais justo e sustentável para todas as pessoas.

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Cada rua, um capítulo, cada esquina, uma promessa, cada praça, um encontro: a cidade que eu quero para mim e para todos

Todo mundo deveria ter o direito de viver em uma urbe inclusiva, um abraço coletivo, reconfortante

Por Helena Degreas – 30/12/2023 10h00 – Atualizado em 30/12/2023 10h07 para a Jovem Pan News

EDI SOUSA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Tomo o ônibus. Ao longo do trajeto, esbarro meu olhar no tanto de gente, gente e mais gente que se move sem rumo aparente. Atravessam ruas, entram e saem, nem sei bem para onde vão, nem de onde vêm. Penso que nem eles sabem o motivo. Encontram-se nas esquinas, olham o céu, repletos de esperanças, aguardando que o ano novinho em folha possa trazer as conquistas e os abraços tão desejados que 2023 não pôde entregar. Adultos, criançasidosos, pessoas, enfim, são todos feitos de sonhos e, como na poesia que ouço na forma de canção enquanto escrevo, sonhos não envelhecem (salve Milton Nascimento!). Envelhece o corpo, mas nossos sonhos permanecem intocados, resilientes à passagem do tempo, resistindo, latentes, aguardando sua realização.

Comecei o dia assim, pensando na cidade em que desejo morar, onde estão as pessoas que amo, meus amigos e que quero chamar de lar. É a cidade que “todes” deveriam ter o direito de viver. Uma urbe inclusiva, um abraço coletivo, reconfortante. Entre suas vielas, sentimentos e aspirações ganham vida e se materializam em paisagens inimagináveis, lindas, únicas, construídas a partir da participação e interação de toda a gente. Suas ruas, calçadas e caminhos pulsam as emoções de seus habitantes, cujas formas urbanas concretizam sonhos compartilhados. Cada rua, um capítulo; cada esquina, uma promessa de pertencimento; cada praça, um encontro público, sem restrições. Penso no aroma do café e no sabor do pão na chapa lá da padoca da esquina, no mercadinho que nem sempre tem o que quero, mas que tem a dona Yumi, que guarda Nira porque sabe que gosto, no som alegre das gargalhadas das crianças e adolescentes nas praças e parques verdinhos, que, distribuídos em todos os bairros, dão sombra fresca e acolhem, como lar, toda a bicharada e insetos que uma cidade grande pode acolher. Nas paredes, longe das galerias e museus, a arte das ruas expressa, com seus grafites, pinturas, intervenções e apresentações de artistas anônimos, as diversas vozes, nem sempre ouvidas pelos meios de comunicação e políticos, os discursos e falas que também deveriam compor o debate público.

É de gente que são construídas as cidades. E gente busca, em cada ação diária, do despertar ao adormecer, sentir-se feliz, ao menos por um instante. É nas pessoas, nas suas histórias entrelaçadas e nos sonhos compartilhados que as cidades se constroem. É o “rio de asfalto e gente”, quadro vivo da urbanidade que se desenrola pelas ladeiras e que entorna pelos meios-fios. Esquinas que abrigam milhões de histórias, lugar perfeito para que desejos, culturas, vidas e o inesperado misturem-se expondo a identidade e a riqueza que não se repetem em lugar algum. Desejo para 2024 uma cidade plural, que acolha histórias e sonhos, e que se torne um lar para todas as pessoas.

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Coletivos ambientais remodelam o cenário urbano e promovem a infraestrutura verde nas cidades

Busca por cidades mais verdes e ecologicamente equilibradas é uma empreitada que encontra inúmeros desafios, especialmente quando impulsionada por coletivos urbanos e grupos de ativistas dedicados ao plantio de árvores

Originalmente publicado Jovem Pan > Opinião Jovem Pan > Comentaristas > Helena Degreas  em 21/12/2023 17h14 – Atualizado em 21/12/2023 18h31

Fotos Gratuitas/Freepik

Imersa em uma realidade natalina para lá de estranha, vejo pessoas carregando árvores de plástico já decoradas com a tão esperada neve tropical enquanto enfrento temperaturas de 38 °C em ruas desprovidas de sombras. Nas redes sociais, cidadãos reclamam das ondas de calor enquanto arrancam árvores da calçada com o objetivo de “melhorar a entrada do estacionamento” do condomínio onde residem, regozijando-se com os valores irrisórios das multas e a falta de fiscalização pública. Este último fato ocorreu na semana passada em uma discussão acalorada em um grupo de WhatsApp do qual, para minha infelicidade, sou obrigada a participar. Apesar do caos cotidiano que nos envolve, no último ano, encontrei grande satisfação em dedicar meu tempo livre ao voluntariado ambiental, participando ativamente do plantio de árvores com pessoas comprometidas em aprimorar as condições climáticas para as gerações futuras. No Brasil, onde aproximadamente 85% da população reside em ambientes urbanos, e globalmente, com mais de 50%, a empatia, generosidade e afeto são valores que prevalecem nestas iniciativas que, para o benefício do planeta e de todos nós, transformam positivamente nossas vidas.

A busca por cidades mais verdes e ecologicamente equilibradas é uma empreitada que encontra inúmeros desafios, especialmente quando impulsionada por coletivos urbanos e grupos de ativistas dedicados ao plantio de árvores. Nas discussões online dos grupos dos quais participo, surgiram algumas postagens que revelaram os entraves enfrentados por comunidades engajadas, destacando as barreiras encontradas no relacionamento e apoio do poder Executivo municipal encontradas em seus esforços para transformar o ambiente urbano. A história que descrevi no começo da coluna, foi apenas uma situação comum e reafirma visões individualistas, egoístas do ser humano, expressas no ditado popular “Farinha pouca, meu pirão primeiro”. Graças à educação, nossos jovens tendem a compreender e a agir em prol de uma realidade em que o comprometido com o bem-estar de todos os seres vivos do planeta, prevalece. Ególatras e “carrocêntricos” são uma espécie em extinção, portanto.

Apesar das dificuldades, ao longo do tempo, observei um aumento no número de cidadãos envolvidos em coletivos movidos por razões voltadas para o bem público. Eles persistem e buscam beneficiar toda a comunidade de maneira abrangente, contribuindo para o bem-estar da sociedade e a preservação sustentável das cidades. Essas ações geralmente são realizadas de forma colaborativa, envolvendo a participação ativa da comunidade local, grupos de voluntários, coletivos ambientais e organizações não governamentais, apontando para um futuro promissor em que a sustentabilidade apresenta-se como diretriz para a construção de um urbanismo verde.

Nas discussões dos grupos, os maiores entraves encontram-se na atuação e interferência do poder público municipal. Guiado por um funcionamento burocrático, cuja tomada de decisões contrasta com abordagens voltadas à atuação desses grupos, a ação que visa a eficácia do processo de intervenção urbana por meio do plantio de corredores ecológicos no contexto climático, praticada e reivindicada pelo ativismo ambiental, expõe a falta de alinhamento e congruência do discurso público de constituição de cidades resilientes aos extremos climáticos. Suas ações, cujo tempo de implantação esbarra em um sistema de governo onde o cumprimento de regras e procedimentos burocráticos é mais valorizado do que a própria ação, engessam uma realidade viva e diversa. Não faltam exemplos dessas barreiras, que vão da dificuldade, quando não da relutância persistente, do poder público municipal em fornecer mudas para projetos que buscam criar jardins de chuva em bairros alagáveis, até o adensamento de áreas vegetadas com a inclusão de espécies nativas ou o plantio em calçadas para proporcionar sombra aos pedestres, que se mostram, dentre tantos outros, obstáculos constantes para essas iniciativas, gerando frustrações em seus esforços para o plantio.

Esforços mais recentes deste grupo mostram a busca pelo plantio em “corredores ecológicos”. A implementação de corredores ecológicos urbanos, derivada das deliberações e atividades desses grupos, mostra-se alinhada com as metas da Agenda Urbana Ambiental Internacional. Desde 2020, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) está apoiando uma iniciativa para coordenar, de forma técnica, a plantação de um trilhão de árvores no mundo objetivando reverter centenas de danos causados a florestas, pantanais e ecossistemas em todo o mundo. Em suas conferências, a Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o período entre 2021 e 2030 como a Década da Restauração dos Ecossistemas. 

Embora suas atuações se restrinjam ao âmbito local, observei que as diretrizes propostas visam integrar porções de ecossistemas naturais ou seminaturais ou na criação de novas áreas verdes, buscando facilitar a dispersão de espécies, revitalizar áreas degradadas e sustentar populações de organismos vivos, tanto da fauna quanto da flora, que necessitam de extensões mais amplas para sua subsistência. Ao destacar a participação ativa dos grupos ativistas, especialmente o coletivo Corredor Ecológico Urbano Butantã, dedicado ao plantio de árvores, arbustos e forrageiras em áreas públicas como calçadas e outros espaços livres públicos disponíveis em sistemas viários, essas ações estabelecem a conectividade biológica, facilitando a mobilidade de flora e fauna, promovendo a troca genética e estabelecendo uma malha contínua de áreas verdes com habitats interconectados. Nesse contexto, Nik Sabey, idealizador do movimento “Novas Árvores por Aí” (SP), mobiliza a realização de plantios coletivos, envolvendo escolas, organizações não governamentais e diversos interessados, assim como novas iniciativas como o Corredor Ecológico Ipiranga (SP), que busca unir o Parque Fontes do Ipiranga ao Córrego Jaboticabal, e a proposta de criação do Corredor Ecológico Urbano Ibirapuera (SP), conectando o Jardim da Aclimação ao Parque do mesmo nome, reforçando o compromisso desses grupos com a preservação ambiental e a integração de espaços verdes na cidade.

Ao fortalecer a resiliência ambiental do sistema ecológico urbano, essas ações possibilitam a adaptação e migração de espécies diante de perturbações, contribuindo para a melhoria da qualidade ambiental, favorecendo a regulação térmica e a gestão das águas pluviais. Adicionalmente, promovem o bem-estar da comunidade por meio de espaços verdes contínuos em áreas residuais provenientes das sobras do sistema viário, atuando de maneira ativa na preservação da biodiversidade, mesmo em ambientes densamente construídos. Nessa jornada em que estive envolvida nos últimos dois anos em busca de cidades resilientes, destaco a ascensão e o protagonismo do ativismo urbano como agente catalisador das ideias de um urbanismo verde voltado ao cotidiano dos cidadãos.

Além de remodelar o cenário urbano, esse movimento impulsiona a melhoria da qualidade de vida e a promoção da infraestrutura verde nas cidades, exemplificando boas práticas em diversas esferas. Acredito que o ativismo instiga o diálogo público ao realizar campanhas educativas e workshops, sensibilizando a população sobre a importância do plantio de árvores e cuidados necessários para aprimorar as cidades. Ao envolver as pessoas em eventos como plantios coletivos, observação de pássaros locais, criação de pequenas hortas em praças ou a instalação de colmeias de abelhas sem ferrão, promove-se a valorização da vida comunitária, congregando moradores, escolas e empresas em esforços conjuntos para construir ambientes mais sustentáveis. Adicionalmente, práticas como a defesa incansável de políticas públicas robustas, o uso de tecnologia inovadora para o monitoramento ambiental, intervenções artísticas, parcerias estratégicas com o setor privado e o estímulo ao voluntariado consolidam o ecossistema do ativismo urbano. 

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Enquete Jovem Pan para esta coluna:



Incluir as pessoas nas deliberações de planejamento dos espaços urbanos é fundamental para construir um futuro mais inclusivo

Mirar na fluidez do transporte individual motorizado e esquecer dos cidadãos revela uma visão anacrônica de planejar o projeto das cidades 

Originalmente publicado Por Helena Degreas para a Jovem Pan News
12/12/2023 11h00 – Atualizado em 12/12/2023 11h09

Passarela flutuante liga o Parque Bruno Covas à ciclovia Franco Montoro – Divulgação/Governo do Estado de São Paulo

A busca por soluções para os eventos climáticos extremos que incorporem e priorizem a integração da perspectiva de gênero nas diretrizes de projeto e planejamento urbano é o caminho para a construção de cidades sustentáveis. Emergência climática e a injustiça de gênero no acesso aos serviços urbanos é uma das questões transversais que encontra-se na pauta da agenda internacional de discussões urbanas que vem sendo debatidas na 28ª sessão da Conferência das Partes (COP28) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) entre os meses de novembro e dezembro de 2023 na Expo City, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU).

Questões de gênero permeiam como categoria relacional e simbólica as construções sociais, influenciando a qualidade de vida das pessoas. Cidades não são “neutras”, pois materializam valores de grupos sociais que, embora subjetivos, manifestam-se em sua estrutura espacial. Pelas hierarquias e prioridades daqueles que exercem o poder, ruas e bairros vão se modelando, gerando as desigualdades que se apresentam na vida cotidiana. Pesquisadores urbanos afirmam que o viés androcêntrico tem demonstrado falhas significativas na provisão de espaços públicos adequados para atender às necessidades de mulheres de baixa renda e residentes em comunidades onde a autoconstrução é predominante. Mesmo nas condições mais simples, essas mulheres constroem lares, locais onde criam seus filhos, cuidam de seus familiares e se encontram com amigos. Sua vidas e suas tarefas diárias diferem e muito daquelas exercidas pelos homens. “Cidade predominantemente a pé” é uma expressão que resume o cotidiano de todas elas: levar os filhos à escola, comprar algo próximo r cuidar da casa são situações corriqueiras. A qualidade de vida, sob a ótica da sustentabilidade, estabelece uma relação intrínseca entre as condições de vida, o entorno social e o meio ambiente, integrando, em outras palavras, aspectos econômicos, sociais e ambientais, ampliando a compreensão do conceito para além de meros indicadores monetários ou visões rodoviaristas há muito descartadas pelo urbanismo voltado às pessoas em cidades cujos gestores públicos e técnicos urbanos são sensíveis ao tema.

Ao não incorporar ou ignorar aspectos fundamentais da vida cotidiana das pessoas como o cuidado, a distribuição assimétrica de tempo e tarefas ou a violência de gênero enfrentada por mulheres, perde a cidade, perdem as mulheres e deixa-se de investir em nossas crianças e jovens. Essa falta de neutralidade se reflete nas estruturas urbanas que frequentemente ignoram ou excluem as experiências específicas das mulheres, criando ambientes que não são verdadeiramente inclusivos.

Recentemente, tive acesso ao “Relatório dos Acessos ao Parque Linear Bruno Covas Novo Rio Pinheiros,” de autoria do Instituto Caminhabilidade (Laboratório Rio Pinheiros), que descreve como a predominância de decisões conduzidas por homens resulta em cidades desiguais, onde as experiências e necessidades das mulheres são sub-representadas, transformando o Parque Linear Bruno Covas em um estudo de caso em que barreiras de acesso predominam, o que evidencia a falta de adequação das políticas públicas às realidades específicas das mulheres. A pesquisa, realizada em 97 comunidades lindeiras ao parque (em um raio de 2,4 km em toda a extensão do parque das quais 60 comunidades encontram-se num raio de 2,4 km dos acessos existentes), apresenta diagnósticos e soluções para melhorar o acesso das pessoas ao local, considerando a situação de possibilidades de acesso a pé e por bicicletas (entre outubro de 2021 e abril de 2022). Por meio de entrevistas e mapeamentos realizados com as lideranças locais, foram comparados os tempos de deslocamento (a pé, de bicicleta e de transporte público) das comunidades até a entrada do parque mais próxima (Ponte Cidade Jardim e Ponte Laguna), com as distâncias geográficas entre comunidades e o parque (a distância em linha reta da comunidade até a margem do rio). Tão perto, mas tão longe: curiosamente, apesar da proximidade física, as pessoas levam muito tempo para poder alcançar as instalações do parque. De que adianta ver o parque e não conseguir chegar nele? Qual o sentido de investir na construção de um elemento espacial tão importante, que compõe a tão escassa infraestrutura de lazer urbano, se não há entradas suficientes para as pessoas que moram em frente a ele? Desenvolvam o projeto de acesso às comunidades do entorno, por favor. Mirar na fluidez do transporte individual motorizado e esquecer as pessoas? Planejamento e projeto urbanos anacrônicos. Corrijam o equívoco.

A mobilidade urbana é um dos pontos focais destacados no relatório do Parque Pinheiros. A presença limitada das mulheres nas ruas, muitas vezes moldada pelo machismo estrutural, gera uma sensação de insegurança que impacta diretamente a forma como elas se movem e acessam a cidade. As barreiras de deslocamento, frequentemente relacionadas aos padrões de cuidado atribuídos às mulheres, são identificadas como obstáculos significativos ao acesso a empregos e educação. O urbanismo feminista, uma abordagem evidenciada no relatório, surge como resposta a esses desafios. Reconhecendo que uma cidade boa para as mulheres é benéfica para toda a comunidade, esse movimento propõe a caminhabilidade como componente essencial para criar ambientes urbanos mais equitativos. A implementação desses princípios no Parque Pinheiros catalisa mudanças significativas, tornando os espaços mais acessíveis, seguros e promovendo uma participação mais ativa e igualitária na vida urbana.

No âmbito climático, a conexão intrínseca entre uma cidade mais equitativa e a luta contra as mudanças climáticas é evidenciada. O modelo urbano centrado nos carros é desafiado pela ênfase na caminhabilidade e no transporte sustentável propostos no relatório. Reduzir a dependência de veículos motorizados contribui para a diminuição das emissões de carbono, alinhando-se aos esforços globais para enfrentar a crise climática. A criação de espaços multiuso, conforme sugerido no relatório, reduz a necessidade de deslocamentos desnecessários, promovendo a eficiência no uso do espaço urbano e contribuindo para a redução do tráfego e da poluição associada. A parceria estratégica com escolas públicas locais, integrando o parque ao currículo educacional, destaca uma visão holística da sustentabilidade ao educar as gerações futuras sobre a importância da equidade de gênero, acessibilidade e cuidado com o meio ambiente. A formação de grupos de representantes comunitários para decisões mais participativas na construção do parque ressalta a importância do envolvimento da comunidade. Esse processo não apenas promove um senso de propriedade local, mas também assegura que as soluções sejam contextualizadas e verdadeiramente representativas das necessidades da comunidade.

Em resumo, o Parque Pinheiros perde a chance de ser tratado pelas autoridades públicas com políticas inovadoras no âmbito do planejamento urbano ao incorporar a perspectiva de gênero em seu projeto. Ao enfrentar os desafios específicos enfrentados pelas mulheres nos espaços urbanos, o parque não apenas poderia melhorar a qualidade de vida das mulheres e seus filhos, mas também desempenhar um papel vital na construção de cidades mais sustentáveis e justas. Queremos um futuro urbano mais inclusivo, igualitário e ecologicamente consciente? Incluam os cidadãos e as cidadãs nas deliberações de planejamento dos espaços urbanos.

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‘Cidades Esponja’ se tornam solução inovação inovadora para complexidade das chuvas intensas

Conceito proposto por pesquisador chinês visa transformar áreas urbanas em espaços capazes de absorver e gerenciar águas pluviais durante temporais

Por Helena Degreas

28/11/2023 11h00

Originalmente publicado Jovem Pan > Opinião Jovem Pan > Comentaristas > Helena Degreas > ‘Cidades Esponjas’ se tornam solução inovação inovadora para complexidade das chuvas intensas.

Vista aérea de Chongqing, na China, exemplo bem-sucedido de “Cidade Esponja”

Em meio ao aquecimento global, evidencia-se o aumento de chuvas mais intensas, especialmente em áreas urbanas com sistemas de drenagem pluvial desatualizados, inicialmente concebidos para lidar com padrões de distribuição temporal e espacial das chuvas em volumes distintos dos observados atualmente. No século passado, as infraestruturas foram planejadas e construídas para acelerar a coleta de água da chuva em direção a rios, lagos ou oceanos. Embora tenham sido eficientes na captação e encaminhamento das águas pluviais à época, o incremento das chuvas intensas resultou em inundações mais frequentes, desafiando as infraestruturas urbanas devido à sua concentração e volume. Nossas cidades, predominantemente impermeáveis e revestidas por asfalto e concreto, obstruem a infiltração da água no solo interrompendo o ciclo natural de escoamento e infiltração natural.

Neste cenário, o conceito recente conhecido por “Cidades Esponja”, proposto pelo pesquisador Kongjian Yu (Diretor da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Pequim) ainda em 2012, surge como uma resposta à necessidade de repensar as abordagens convencionais. Em 2014, já com o apoio do governo central da China, foram criados metas e prazos para reduzir o efeito dos extremos climáticos sobre as áreas urbanas. Estabeleceu-se que até 2020, 20% das áreas urbanas seriam permeáveis e que 70% da água da chuva deveria ser reciclada. Até 2030, isso deveria ser 80%. Em cidades como Wuhan, Chongqing e Xiamen, “pilotos de Cidades Esponja” foram iniciados. Chongqing é um exemplo bem-sucedido: em 2020, 24,2% da área urbana da cidade havia sido transformada. Até 2025, eles esperam que mais de 45% da cidade atenda às metas previstas em planejamento.

As Cidades Esponja buscam transformar áreas urbanas em espaços capazes de absorver e gerenciar águas pluviais durante chuvas intensas, liberando-as gradualmente em períodos de seca. Essa abordagem visa equilibrar os desafios aparentemente contraditórios de inundações e escassez de água, proporcionando uma solução holística para as complexidades climáticas urbanas. Aparentemente simples, a implementação desse conceito implica em intervenções urbanas e institucionais significativas. Trata-se de uma mudança de cultura no âmbito do planejamento urbano e, principalmente, da maneira de atuar em construção civil quando voltada às infraestruturas destinadas ao cuidado das águas pluviais em cidades. É necessário repensar a infraestrutura urbana, substituindo parte das superfícies impermeáveis por áreas permeáveis, como jardins, parques e espaços verdes. Essas intervenções não apenas ajudam a absorver e reter a água da chuva, mas também contribuem para criar ambientes urbanos mais sustentáveis e resilientes. A criação de microbacias de retenção (espelhos d’água em praças, lagoas em parques são alguns exemplos), telhados verdes e pavimentos permeáveis são algumas das estratégias adotadas para transformar as cidades em verdadeiras esponjas urbanas.

Contudo, a eficácia da iniciativa das Cidades Esponja depende significativamente da capacidade de governança para implementar e gerenciar essas mudanças. Diante desse desafio, propõe-se a criação de um mecanismo institucional dedicado, responsável pela gestão operacional, planejamento, organização, coordenação, governança e avaliação diária da implementação. Essa agência, ou figura administrativa pública, seria encarregada de manter um inventário detalhado dos projetos, registrando informações essenciais desde o tipo de projeto até lições aprendidas. Além disso, atuaria como facilitadora da cooperação internacional, fornecendo orientações e aconselhamentos na elaboração de políticas de desenvolvimento urbano alinhadas ao propósito das Cidades Esponjas, promovendo a integração com outras iniciativas governamentais. Outra questão importante e que permeia os quadros técnicos públicos e institucionais, é a cultura orientada para a engenharia (dura), em que prevalece uma abordagem na qual a dominação do ambiente físico pelos humanos ocorre através de soluções tecnológicas e estruturais para desafios hídricos.

No Brasil, uma das soluções prioritariamente adotadas por governos é bem conhecida: os “piscinões”, estruturas projetadas para armazenar grandes volumes de água pluvial durante chuvas intensas. Embora fundamentais para o controle de águas pluviais, apresentam riscos à saúde pública, propiciando a proliferação de vetores de doenças como dengue. Além disso, causam impactos ambientais ao modificar habitats naturais, afetando a biodiversidade local, e podem comprometer a estética urbana, reduzindo o apelo visual. Sua proximidade também pode depreciar o valor imobiliário de áreas circundantes, enquanto a falta de manutenção pode transformá-los em locais de acumulação de resíduos, prejudicando a qualidade da água e do entorno.

Mesmo na implementação inicial da Iniciativa Cidades Esponjas na China (SCI), essa mentalidade tecnocrática persiste ainda, tratando a iniciativa como um projeto de engenharia convencional. Assim, é crucial que a China promova uma mudança na ideologia de gestão, favorecendo a transição para o pensamento sistêmico na governança e planejamento de desenvolvimento buscando a transformação cultural por meio de iniciativas educacionais e de treinamento para capacitação, juntamente com colaborações em pesquisa.

Em conclusão, a proposta das Cidades Esponjas representa uma mudança fundamental na abordagem de gestão urbana na China, visando lidar de maneira mais eficaz com as questões de inundações e gestão de águas pluviais e serve de referência para a gestão urbana de várias cidades brasileiras. No entanto, o sucesso dessa iniciativa está diretamente relacionado à capacidade do governo em adotar medidas técnicas, de governança, financeiras e organizacionais adequadas para superar os desafios de implementação. A gestão da iniciativa deve transcender a abordagem de projetos independentes para uma governança participativa e programática, incorporando planejamento adaptativo e reflexão contínua. O aprendizado entre cidades, compartilhando experiências e promovendo boas práticas e inovações, desempenha um papel crucial na construção de cidades resilientes à água.

Dessa forma, as Cidades Esponjas não apenas representam uma solução inovadora para as complexidades das chuvas intensas, mas também uma visão abrangente e diretrizes para que governos integrem ações voltadas à implantação de infraestrutura verde e práticas sustentáveis com o objetivo de criar ambientes urbanos mais resilientes e ecologicamente amigáveis.

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Arborização urbana, centros de resfriamento e mais: confira estratégias adotadas para minimizar as ondas de calor

Necessidade de alinhar políticas públicas e sensibilizar a população torna-se ainda mais evidente diante da urgência climática

Coluna originalmente publicada para a Jovem Pan News

CRISTINA QUICLER / AFP

O crescente desafio de minimizar os efeitos das ondas de calor sobre a saúde física e mental da população nas cidades tem levado diversos gestores públicos a adotar estratégias para a criação de ambientes urbanos mais frescos. Conhecida como infraestrutura de sombreamento, sua abordagem tem sido capaz de resfriar áreas urbanas e proteger as pessoas dos efeitos do calor extremo por meio de ações complexas.

Mais da metade da população mundial mora em cidades e, aqui no Brasil, a porcentagem supera os 80%. Dados associados aos efeitos deste “calorão” e ventos fortes com mais de 100 km/h, caso da cidade onde resido, São Paulo, são previsíveis e merecem prontidão dos gestores municipais. Culpar as árvores ou afirmar que a situação é excepcional apenas reitera o que a maioria dos cidadãos já sabe: gestores e demais atores políticos, muitos deles eleitos pela população, incapazes de apontar caminhos para solucionar a curto, médio e longo prazo os efeitos que os extremos climáticos vem provocando nas cidades. Blá, Blá e Blá, como diria a jovem ativista Greta Thunberg ao se referir aos discursos e falas de governos e seus representantes quanto às ações práticas para alcançar as metas propostas pela Agenda 2030.

Estruturas sombreadas em parques e praças: combinando treliças ornamentais com vegetação, oferecem proteção contra a exposição direta ao sol, especialmente durante períodos de altas temperaturas. Em locais movimentados, essas instalações fixas ou temporárias, muitas delas consideradas “obras de arte escultóricas”, não só proporcionam alívio térmico, mas também se integram esteticamente, criando ambientes urbanos mais agradáveis e sustentáveis, refletindo o compromisso da cidade com o bem-estar da população.

Telhados e paredes verdes: implantação extensiva de telhados e paredes verdes em prédios e equipamentos públicos, reduzindo a absorção de calor e oferecendo áreas sombreadas.

Arborização urbana: Melbourne, na Austrália, foca em aumentar a vegetação nas áreas urbanas, criando sombras naturais. Recentemente, a ministra do Meio Ambiente, Soipan Tuya (Kenya), anunciou a meta de plantio de 10O milhões de árvores com o auxílio da população no feriado local de 13 de novembro. Sua meta, mais ambiciosa, prevê o plantio de 15 bilhões de árvores nos próximos 10 anos e tem por objetivo

Centros de resfriamento: Diversas cidades implementam Centros de Resfriamento durante ondas de calor para proteger os cidadãos. A cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos, abriu os saguões de entrada e ambientes de estar de bibliotecas, centros comunitários, hospitais, escolas e vários edifícios públicos para que a população possa abrigar-se em dias de calor. Melbourne, na Austrália, com Centros de Resfriamento em locais estratégicos comumente instalados em edifícios e equipamentos públicos. Já Tóquio, no Japão, adotou uma política pública para enfrentar o calor extremo por meio da criação de refúgios refrigerados chamados de Centros de resfriamento (tradução livre) em locais estratégicos, como shoppings e ginásios particulares durante períodos de altas temperaturas.

Distribuição de água e informação: Cidades implementam ações proativas durante ondas de calor, como a distribuição gratuita de água em áreas públicas proporcionando acesso fácil à hidratação. Paralelamente, campanhas informativas são conduzidas para educar a população sobre práticas seguras durante condições climáticas extremas. Iniciativas incluem orientações sobre manter-se hidratado e evitar atividades extenuantes ao ar livre, promovendo a conscientização e a prevenção de problemas de saúde relacionados ao calor.

Transporte público refrigerado como refúgio: Os meios de transporte público, como ônibus, metrôs e trens são tratados como refúgios durante ondas de calor, cabendo às autoridades a orientação ao uso desses serviços e locais para permanecer em ambientes climatizados.

Assistência a grupos vulneráveis: equipes de assistência social realizam visitas a comunidades de baixa renda, oferecendo suporte e distribuindo recursos como água e protetores solares. Da mesma forma, em Tóquio, iniciativas focam em garantir que idosos e demais grupos vulneráveis recebam atenção especial durante períodos de calor extremo, fornecendo locais refrigerados e assistência direta.

Projetos de infraestrutura urbana resiliente: algumas cidades, como Melbourne, na Austrália, têm investido em projetos de infraestrutura urbana que visam tornar as áreas urbanas mais resilientes ao calor, incluindo a criação de espaços verdes e pavimentação reflexiva, resultando na redução do calor urbano e melhoria do conforto térmico. Em Phoenix, nos EUA, a cidade investe no desenvolvimento de parques urbanos densamente arborizados e no aumento da vegetação intraurbana, com impacto direto na mitigação das ilhas de calor e na criação de espaços mais frescos. Já em Barcelona (Espanha), um projeto de renovação urbana focado na produção de mais áreas verdes contribui para o aumento da resiliência ao calor e a promoção de ambientes mais agradáveis e frescos.

Regulamentações de edifícios: cidades ao redor do mundo estão implementando regulamentações de edifícios para enfrentar o calor extremo. Exemplos incluem Sydney (Austrália), que estabeleceu padrões para eficiência energética e design sustentável em construções. Da mesma forma, Portland, nos EUA, adota códigos de construção que promovem técnicas de resfriamento passivo e materiais refletivos em edifícios que visam melhorar a eficiência energética e proporcionar ambientes internos mais frescos, contribuindo para a resiliência das cidades em face das crescentes temperaturas.

Sistemas de água urbana: em Singapura, a utilização de lagos e corpos d’água integrados ao design urbano contribui para resfriar o ambiente.

Pavimentos reflexivos ou ainda “pavimentos frescos”: trata-se de uma tecnologia desenvolvida para atenuar as altas temperaturas em áreas urbanas, pois empregam materiais especiais que refletem a luz solar e absorvem menos calor. Sua proposta é minimizar a retenção de calor nas superfícies urbanas, combatendo a formação de ilhas de calor. Além disso, ao melhorar o conforto térmico nas ruas, o “pavimento fresco” contribui para ambientes urbanos mais agradáveis, fomentando práticas sustentáveis na urbanização.

Ciclovias arborizadas: Amsterdã (Holanda) arborizou, ao longo dos últimos anos, suas ciclovias, para proteger os ciclistas do calor excessivo.

Sistemas de nebulização: Lisboa (Portugal) adotou sistemas de nebulização espalhados por toda a cidade para resfriamento temporário.

Alertas de onda de calor: A cidade utiliza sistemas avançados de monitoramento climático para emitir alertas de onda de calor. Esses alertas são divulgados antecipadamente para que os residentes estejam cientes dos períodos de calor extremo. No Brasil, o sistema já é adotado, mas, embora anunciados pela Defesa Civil e outros órgãos públicos, a divulgação de alertas de calor extremo que são enviados antecipadamente aos residentes por meio de mensagem de celular alcançam os cidadãos que dispõe do aparelho e que sejam capazes de pagar por planos de internet para celular.

O planejamento estratégico de ações a curto prazo desempenha um papel crucial no enfrentamento dos desafios climáticos, especialmente nas cidades vulneráveis às ondas de calor. A necessidade de alinhar políticas públicas, promover investimentos em infraestrutura resiliente e sensibilizar a população torna-se ainda mais evidente diante da urgência climática. Os atores públicos, ao considerarem ações imediatas, podem não apenas proteger as comunidades vulneráveis, mas também pavimentar o caminho para cidades mais sustentáveis e adaptadas ao clima no longo prazo.

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Antiguidades e relicários familiares contam histórias, carregam segredos e aguardam a possibilidade de construir novas memórias

Influenciada pela semana de Finados, ou pela lembrança da morte de meu pai, fui tomada por um sentimento de nostalgia misturado com saudade

Acervo pessoal: Helena Degreas

Não sei se influenciada pela semana de Finados, ou pela lembrança da morte de meu pai, que curiosamente ocorreu no dia do aniversário do meu falecido tio Nicolas – que aparentemente veio buscá-lo –, fui tomada por um sentimento de nostalgia misturado com saudade, muita saudade. Na estante, lá no alto, encontrei o rádio de pilha “transistor super de luxe – 3 band, 2 speaker international” e mais um monte de outras coisas escritas, menos o registro da marca, que acabei herdando de meu pai durante o desmonte do seu escritório lá no Brás. É bonito. Prata, preto e antena longa, comprida, para captar as ondas do rádio que ao ser ligado 14 anos depois, por mim, curiosamente, estava sintonizado na rádio Jovem Pan, cujos programas de futebol ele ouvia atentamente até o último dia de sua vida. Gosto do design dos objetos. Sou um ser que acumula tralhas há anos, desde sempre. Não estou presa a um período específico. Distribuídos para todos os lados do meu lar, eles criam uma composição peculiar, para dizer o mínimo.

Outro dia pedi para consertar um móvel que pertencia à minha sogra. Ao entrar em casa, observo a expressão de espanto no rosto do velho marceneiro. Passados alguns segundos, vem a pergunta entrecortada pelo som rouco do cuco que, escondido entre quadros, anunciava a hora com erro de 20 minutos: “A senhora é comerciante de móveis antigos?”, questionou. “Não, meu senhor, é só uma casa repleta de memórias. Minhas e de todos aqueles que já foram seus possuidores”. O marceneiro foi embora com a mesma expressão da entrada, entendeu coisa nenhuma. Só levou a mesa de canto em madeira com patas de leão entalhada para polir. Nem conto o tanto de trabalho que estes detalhes todos me dão para tirar o pó, mas minha sogra gostava dela, cuidava bem de cada detalhe. Sinto-me reconfortada cuidando de algo que lhe pertenceu. Se é que existe algo depois que a gente vira nada, ela deve estar tentando entender o porquê de tanto zelo com uma coisa, um objeto. Sei lá. Não trato como relicário, só como lembrança.

Saio de casa. Sábado de uma manhã ensolarada. Imbuída da missão de escrutinar comportamentos sociais alheios, tenho este triste hábito, meus colegas de pesquisa bem o sabem. Me dirigi à Praça Benedito Calixto a pé. Acordei assim, sem explicação. Vontade de destrinchar segredos, ler a alma e os pensamentos das pessoas à volta em segredo. Na primeira barraca da Feira de Antiguidades deparo-me com várias fotos de época. Em uma delas, uma jovem vestida de noiva estampava um sorriso no rosto, esperançoso, aguardando uma nova fase da vida em que, imaginando-se dona de si, construiria seu lar e o de sua família. Largada sobre uma mesa, a imagem misturava-se às demais quinquilharias, retratando o momento feliz de alguém que desconheço. Quero crer que tenha tido uma vida boa como sonhara e que as fotos de sua realização pessoal e familiar venham a ter um destino melhor do que aquele que seus bisnetos lhe conferiram: abandono. Mais adiante, uma barraquinha repleta de carrinhos, naves espaciais, trens de lata, robôs, super-heróis, fortes-apache, e até uma inusitada caixa de papelão com a imagem do boneco Pedro de Lara, ao lado do boneco Falcon, aguardavam por um lar e pela possibilidade de construir novas e, por que não, agradáveis memórias futuras. “Descartados, os brinquedos carregam mágoas?” pensei.

“Oi, como vai o senhor, tudo bem? Tem alguma história para me contar sobre brinquedos magoados?” perguntei ao Senhor Milton (miltonalemao@ig.com.br), da feirinha de antiguidades. “Tenho”, responde ele de pronto, “várias”. “Sabe, tempos atrás, uma jovem trouxe aqui uma boneca feita de massa, corpo de pano rasgado, olhos fechados, cabelo desgrenhado, parecia castanho, sem nenhuma roupa. Dava para perceber que ela não gostava da boneca. Acho até que detestava. Queria vender de qualquer jeito. Era da bisavó dela. Aparentemente, tinha alguma desavença familiar entre as mulheres da família. Trocava por qualquer valor, tipo troco para cerveja. ‘Não compro bonecas’, eu disse a ela. Mas ela insistia tanto que paguei o valor da tal cerveja. Levei para casa. Decidi não colocar a venda. Dei banho, costurei o corpo de pano, penteei os cabelos que se mostraram lisos, cacheados, pareciam humanos de tão macios que ficaram. Pedi à vizinha que fizesse uma roupinha para não deixá-la assim, tão exposta, digamos. Há que se respeitar o recato, mesmo que de uma bonequinha do século XIX. Feito o vestidinho, o chapéu, lacinhos no cabelo, meia e sapatinhos, deixei sentadinha na estante da sala, dormindo tranquila de olhos bem fechados. Ao acordar no outro dia pela manhã, tomo o café, arrumo a casa e vou até a estante pegar minha carteira. E não é que ela estava de olhos bem abertos observando a casa? Eram azuis, de um azul muito vivo, lindo! Nem precisei consertar. Parecia ter encontrado o respeito, viu um novo lar”, contou Milton.

Outros tantos relatos preencheram minha manhã. Casos de objetos que passaram da condição de relicários familiares para antiguidades e velharias que, comercializáveis por ora, buscam novas serventias. Mosaico de tempos passados, tive o prazer de ouvir histórias únicas, longe dos livros de história, escrutinei pensamentos, comportamentos e li almas através das coisas que pertenciam a pessoas que sequer conheci, contadas pelas histórias de pessoas que sequer conheço no meio de uma feirinha de antiguidades de uma praça que semanalmente comercializa objetos em busca de uma nova oportunidade. Ao sair, levei lembranças, trouxe memórias de outros, agora minhas também e que compartilho com os leitores.

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Por Helena Degreas 04/11/2023 09h00 – Atualizado em 04/11/2023 12h59 para a JovemPanNews

Você aceitaria ser atendido pelo Avatar de um guichê municipal criado no Metaverso?

coluna Jovem Pan News: Governos espalhados pelo mundo estão investindo fortemente na construção de sistemas e dispositivos que simulem aspectos da realidade cotidiana da administração pública.

Na enquete da semana, perguntei às pessoas se elas aceitariam o atendimento para a prestação de um serviço público realizada por meio de um avatar. Um terço aproximadamente respondeu que sim, mostrando que a realidade do sistema Metaverso e suas vantagens ainda são desconhecidos pela maior parte dos cidadãos.

A ausência de familiarização com as potencialidades no uso dos recursos do Metaverso na gestão pública é compreensível pois no Brasil, o tema ainda não recebeu a devida importância pelos governos. Enquanto isso, países que vão da Coreia do Sul até Barbados, país insular caribenho, vem investindo maciçamente no desenvolvimento de ambientes propícios aos desenvolvimento de serviços e produtos públicos que melhorarão a qualidade devida dos cidadãos, das empresas ampliando a criação de novos negócios e empresas digitais nos mais diversos setores.

Da criação de tecnologias disruptivas que eliminam barreiras legais e administrativas no âmbito de vistos e barreiras alfandegárias para negócios e visitas de avatares por todo o mundo até incentivo a criação de guichês de atendimento público instâncias administrativas de governo, o Metaverso é uma realidade que se faz presente a partir do uso de recursos que mesclam realidade virtuais, aumentadas e inteligência artificial para melhorar as condições de vida, educação, lazer, compras, informação e trabalho daqueles que hoje já se utilizam dos recursos online para executar suas atividades cotidianas.

Não tem volta.

As cidades estão preparadas para o envelhecimento da população?

texto original publicado aqui

Idoso caminha de bengala em área residencial de Londres

Como no restante do mundo, a longevidade não é apenas uma tendência, é uma certeza.

Organização Mundial da Saúde (OMS) define como idoso o indivíduo com 60 anos ou mais. O mesmo entendimento está presente na Política Nacional do Idoso (instituída pela lei federal 8.842), que assegura os direitos sociais nos âmbitos da saúdetrabalhoassistência socialeducaçãoculturaesporte, habitação e meios de transportes, criando condições para a promoção da autonomia, integração e participação efetiva na sociedade. Já o Estatuto do Idoso (lei 10.741) regula todos os direitos citados, concedendo atendimento preferencial em estabelecimentos públicos e privados e prioridade na formulação e na execução de políticas sociais públicas específicas.

A idade cronológica nada mais é do que uma convenção social que determina quais grupos sociais têm acesso a direitos e políticas públicas. Recentemente, o prefeito Bruno Covas e o governador João Doria alteraram a gratuidade do bilhete único para pessoas entre 60 e 64 anos. Eles argumentaram que se tratava de uma adequação das políticas públicas que incidem nesta faixa etária, a exemplo da ampliação da aposentadoria compulsória no serviço público, que passou de 70 para 75 anos, e a reforma da Previdência, que fixou a idade mínima de 65 anos para aposentadoria dos homens e 62 a das mulheres. Até mesmo o próprio Estatuto do Idoso foi revisado e incluiu uma nova faixa etária: 80+ como prioridade dentro da prioridade, por assim dizer.

Mas o que significa isso em nosso dia a dia nas cidades? Em 2030, o número de idosos no Brasil deve ultrapassar o número de crianças, aponta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Atualmente, isso representa 14,03% da população, o que equivale a 29,3 milhões de pessoas. É muita gente. Considerando que cerca de 85% da população brasileira vive em cidades, que a longevidade é cada vez maior e que o envelhecimento acontece de forma desigual, a qualidade de vida de todos já está sendo afetada. Maior ou menor grau de dependência nas atividades diárias e isolamento social são alguns dos aspectos mais tristes que vêm ocorrendo com nossos idosos. Não é uma questão relativa apenas à saúde, mas à incapacidade de cuidar de tarefas simples (para os digitais), como pagar uma conta por celular ou ler uma placa de sinalização de rua para localizar-se, por exemplo. Aliás, este assunto será futuramente tratado em outra coluna, mas antecipo uma questão: por que sou obrigada a ler uma placa de rua com aquelas letrinhas miudinhas colocadas na altura adequada para um motorista de ônibus e não para um ser humano?

À exemplo de cidades no mundo, gestores públicos estão conscientes do processo de envelhecimento pelo qual suas cidades estão passando e preparando-se por meio de políticas públicas, programas e ações projetadas para curto, médio e longo prazos. Assim fez Londres. Ainda nos anos de 1980, gestores públicos em todas as instâncias de governo identificaram a redução no ritmo de natalidade, o crescente número de aposentados e problemas de saúde causados pelo sedentarismo dos cidadãos. Como resultado, adotaram programas de incentivo à mobilidade ativa, adaptando toda a infraestrutura de circulação de pedestres ao caminhar das pessoas, melhorando a sinalização viária, trocando pisos e pavimentos e reorganizando tempos semafóricos com o objetivo de evitar gastos públicos com a saúde no século XXI.

As ações adotadas por estes gestores visam ainda hoje ampliar a independência e a liberdade dos indivíduos por meio de um envelhecimento ativo e saudável, prevendo a redução futura da sobrecarga do sistema de previdência, saúde e assistência social, bem como também eventual dependência familiar. As adaptações requerem um processo de planejamento urbano contínuo que pode durar décadas, pois prevê não apenas alterações culturais e comportamentais, mas também interferência direta na forma de projetar e planejar as cidades e as habitações. Para as cidades brasileiras, as ações para atendimento das pessoas idosas são direcionadas para suprir a demanda atual da população. A questão que se coloca é mais complexa, pois determina a previsão das adaptações urbanas necessárias ao longo do tempo visando o envelhecimento ativo, saudável e independente.

Outras formas de pensar a habitação são necessárias, dimensões e programas de atividades precisarão ser repensados. Bairros com usos mistos, nos quais as necessidades do dia a dia podem ser resolvidas a pé, em no máximo 15 minutos, são desejáveis. Programas sociais que incentivem o uso da interação digital podem melhorar a qualidade da informação, da comunicação e da solução de problemas triviais de quem mora na cidade sem a dependência de alguém mais jovem, um filho ou neto, por exemplo, para comprar um produto ou pagar uma conta. E, por fim, desenvolver ações que integrem gerações nos vários ambientes sociais, garantindo que as pessoas continuem ativas, afastando o isolamento por vezes resultante de preconceitos associados à velhice.

Não basta que o poder público faça a zeladoria dos espaços públicos. Tapar buracos, trocar lâmpadas, consertar bancos de praças são assuntos inerentes à manutenção corriqueira e obrigatória do espaço urbano realizadas por agentes públicos. Uma boa ação é analisar dados de longevidade e permanência nos distritos urbanos, avaliando, no tempo, as necessidades de um distrito para daqui a dez, quinze, vinte anos, preparando toda a infraestrutura pública e equipamentos urbanos locais para atender a essa nova demanda lá no futuro. É o que faz a cidade de Nova York, dentre outras cidades estadunidenses. Portanto, oferecer festinhas sociais como bailes e concursos de misses em clubes e centros comunitários para esse grupo etário é bem interessante, mas não o suficiente para manter um indivíduo ativo e independente ao longo da vida. Cidades são feitas por pessoas e para pessoas, portanto cabe aos gestores públicos prever demandas, tendências e utilizar dados estatísticos a favor da qualidade de vida da população no futuro próximo.