Esse post tem por objetivo apresentar de forma sistematizada uma visão do estado de arte das praças brasileiras desde a sua origem até o início dos anos 2000. O material utilizado foi produzido ao longo de 7 anos de estudos do grupo QUAPA – Quadro do Paisagismo no Brasil, liderado pelo Prof. Dr. Silvio Soares Macedo e desenvolvido no Laboratório da Paisagem da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo entre 1994 e 2001.
Num primeiro momento, falaremos sobre a formação e evolução da praça na cidade brasileira, do final do século XVIII aos anos finais do século XX.
Várias são as definições para o termo praça. Mesmo havendo divergências entre autores, a praça é caracterizada como um espaço público destinado à con-vivênica de seus cidadãos, contextualizado em ambiente urbano e que se encontra livre de edificações.
No Brasil, o termo praça é comumente associado à idéia de áreas livres, geralmente ajardinadas, repletas de equipamentos públicos destinados à recreação de seus usuários conflitando em muito com os espaços e projetos dessa tipologia no continente europeu.
Para os gregos, a ágora era o espaço livre público por excelência, local onde o exercício da cidadania se materializava representando o espírito de coletividade da população.

A Ágora grega era o espaço público aberto da antiguidade clássica onde se praticava a democracia direta ou ainda, o lugar por excelência do debate das idéias, dos tribunis populares e onde eram discutidos os negócios e decididos os rumos da cidade. Por meio de assembléias e com direito igual a voto, aqueles considerados cidadãos eram ouvidos. Tratava-se de um espaço delimitado por edificações diversas de caráter público e Stoas, ou ainda, conjunto de pórticos ou colunatas abertos ao público onde o mercadores em feiras livres podiam comercializar seus produtos. Da ágora, era possível avistar a acrópole, ou ainda, o ponto mais alto da cidade (do grego ἀκρόπολις, composto de ἄκρος, “extremo, alto”, e πόλις, “cidade”). Nesse lugar, eram construídos os templos aos deuses como o Parthenon em Atenas ou ainda os palácios.
Para os romanos, o Fórum era constituído por um espaço livre público central onde ocorriam as relações sociais, as atividades comerciais, religiosas e de mercado da comunidade.

O fórum romano era o centro comercial da Roma imperial. Nele localizavam-se as lojas, praças de mercado e locais para assembleias dos civitas ou ainda, cidadãos. Diferentemente da Ágora grega, o fórum era configurado por imponentes edifícios públicos que representavam a monumentalidade do Estado. As discussões políticas aconteciam não nas praças abertas, mas no interior dos edifícios.
Origens
Em seus estudos sobre praças contemporâneas, Macedo (2002) considera duas premissas básicas para conceituar tais espaços: uso e acessibilidade, conceituando-os como espaços livres urbanos destinados ao lazer e ao convívio da população, acessíveis aos cidadãos e livres de veículos. Lembramos que os estudos foram elaborados a partir das praças nas cidades contemporâneas brasileiras. Ainda assim, essa tipologia mantém o caráter de sociabilidade que é intrínseco às funções da praça descartando-se alguns logradouros públicos enquadrados como tal e que nada mais são do que canteiros centrais, rotatórias, restos de sistemas viários gramados não oferecendo condições mínimas adequadas ao exercício do lazer ou acessibilidade da população. Tal fato se deve à necessidade de muitos órgãos públicos municipais de ampliar quantitativamente o número dos seus espaços públicos e de lazer perante a comunidade.
Os primeiros espaços livres públicos urbanos surgiram no entorno das Igrejas. Ao seu redor, foram construídos os edifícios públicos, palacetes e comércio servindo como local de convivência coletiva da comunidade. Murilo Marx afirma que a praça deve a sua existência sobretudo aos adros das Igrejas, onde serviu como espaço para reunião de pessoas e para um conjunto de atividades diferentes, caracterizando-se de forma bastante típica e marcante.
A forma urbana influenciou o traçado de nossos logradouros públicos. Se para a colonização espanhola, as ruas eram traçadas em cruz e na colonização inglesa, francesa, holandesa e belga, os traçados obedeciam a sistemas em xadrez, radiocêntricos e lineares, as cidades de colonização portuguesa cresceram de forma espontânea assumindo a modelagem do terreno e de maneira informal, quando não, à margem da lei.

Madri: http://migre.me/nQ8Y
- Vista panorâmica sobre a Londres moderna,
vista da Golden Gallery da Saint Paul’s Cathedral: http://migre.me/nQbZ
Praças, Largos, Adros, Átrios e Pátios
A praça como a conhecemos hoje, sempre foi o local para reunião de gente e para o exerício da vida pública destacando em frente aos edifícios públicos, igrjeas ou conventos destacando-se na paisagem urbana.
“ Os templos, seculares ou regulares, raramente eram sobrepujados em importância por qualquer outro edifício, nas freguesias ou nas maiores vilas. Congregavam os fiéis, e os seus adros reuniam em torno de si as casas, as vendas e quando não o paço da câmara. Largos, pátios, rocios e terreiros, ostentando o nome do santo que consagrava a igreja, garantiam uma área mais generosa à sua frente e um espaço mais condizente com o seu frontispício. Serviam ao acesso mais fácil dos membros da comunidade, à saída e ao retorno das procissões, à representação dos autos-da-fé. E, pelo seu destaque e proporção, atendiam também a atividades mundanas, como as de recreio, de mercado, de caráter político e militar. À linearidade, as ruas de interligação como as chamadas Direitas. À irregularidade, uma outra ordem que não a das vias ortogonais”. In: MARX, Murillo. Cidade Brasileira. São Paulo: Melhoramentos/Edusp, 1980, p. 54.

Praças secas européias


Pátios ou ainda Átrios
O conceito dos pátios remete-se à necessidade humana e proteção do espaço exterior, desconhecido e hostil. Devido ao seu isolamento, proporciona aos seus habitantes, a impressão de domínio, pois o homem necessita de planos de paredes ou cercamentos para sentir-se seguro. Mesmo após longa evolução que alterou aspectos funcionais, o pátio permanece centralizado na edificação, delimitado por paredes e não coberto. A forma em planta não fixa, podendo apresentar-se circular, quadrado, oval ou retangular. A única certeza é que trata-se de espao delimitado pelos muros que o cercam. Várias são suas funções e por isso, apresentam mobiliários e formas distintas. Existem pátios de fábricas, de residências, de claustros, de escolas, de presídios, de conjuntos de casas.

” Na cidade, os pátios são espaços livres públicos definidos a partir de uma igreja ou outro elemento arquitetônico expressivo, além do casario antigo aos quais dá acesso, quase sempre pavimentados e exercendo a função de respiradouros, de propiciadores do encontro social e eventualmente destinados a atividades lúdicas temporárias.”
SÁ CARNEIRO, Ana Rita, MESQUITA, Liana de Barros (orgs.). Espaços livres do Recife. Recife: Prefeitura da Cidade do Recife/UFPE, 2000, p. 29.
Largos
“São espaços livres públicos definidos a partir de um equipamento geralmente comercial, com o fim de valorizar ou complementar alguma edificação como mercado público, podendo também ser destinados a atividades lúdicas temporárias.”
SÁ CARNEIRO, Ana Rita, MESQUITA, Liana de Barros (orgs.). Espaços livres do Recife. Recife: Prefeitura da Cidade do Recife/UFPE, 2000, p. 29.


Adros
Os adros são as áreas externas, cercadas ou não, de edificações religiosas que geram espaços contíguos bastante característicos. Tem caráter público e agregador social, dervindo ainda hoje para a realização de procissões e festas religiosas, feiras e mercado livre ou ainda espaço de lazer da população.


Disponível em: http://migre.me/nP9H . Acesso: 12.03.2010 18:25:15
MARX, M. Cidade Brasileira. São Paulo: Melhoramentos: Editora da Universidadede São Paulo, 1980.
ROBBA, F; MACEDO, S. S. Praças Brasileiras. (public squares in Brazil). São Paulo: Edusp: Imprensa oficial do Estado. 2002, 312p.
SEGAWA, H. Ao amor do público: jardins no Brasil. São Paulo: Studio Nobel:Fapesp, 1996.
Fonte de referência: acervo QUAPA, QUAPASEL
Revistas Paisagem & Ambiente: ensaios (coleção QUAPASEL)
MACEDO, Silvio Soares e ROBBA, Fábio; Praças Brasileiras; São Paulo: Edusp, 2002, ISBN 85-314-0656-0
Para você aluno: vale à pena pesquisar nesses dois links pois eles contém mais de duas centenas de projetos de paisagismo distribuídos em todo o país.
http://winweb.redealuno.usp.br/quapa/
http://winweb.redealuno.usp.br/quapa/busca.asp
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Professora Helena,
Nos conhecemos na Casa Acessivel, sou a Acácia Lischewski idealizadora da Mostra e gostaria muito do seu endereço eletrônico para convida-la a eventos maravilhosos que faremos na Casa. O próximo será no dia 15/07 Um jantar na Cozinha da Dep. Célia Leão. Vamos?
Bjos
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Olá Acácia,
Tudo bem com você? coloquei sua mostra no meu twitter. No blog ainda não unfortunatelly. Meu email para contato é helenadegreas@uol.com.br
bjs
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olá Helena, gostei deste post. Estou pesquisando a Ágora e gostaria de saber se você tem por acaso algum texto que aborde a “morte” de nossas praças, justamente pela pobreza de usos atualmente. A ágora tinha uma vida exuberante devido às suas múltiplas funções. Quem aborda muito bem este tema é Jane Jacobs, você conhece?
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Olá Alexandre!
Desculpe a demora em responder email tão gentil. Confesso que também pensei bastante antes de responder.
Os textos de Jane Jacobs são excelentes e utilizamos em sala de aula sempre. Sua abordagem é bastante interessante e fala sobre a morte da esfera pública nas cidades americanas. Controvérsias à parte (não falo por meus colegas de pesquisa), considero que o espaço público não morreu não… só mudou de forma e lugar.
Entendo que a “morte” ou o declínio do espaço público vai muito além da pobreza de usos destes espaços, incluindo nele, seu objeto de estudo: a praça.
Não digo tanto o uso e sim a “realização da apropriação destes espaços pelo público do espaço público”, como diz minha querida amiga Vanderli Custódio lá do IEB.
Não é isso? Para que a realização da apropriação, para que o sujeito viabilize a ação (porque vida é ação e movimento), são necessárias várias condicionantes que vão da necessidade, vontade (do indivíduo) às condições minimamente necessárias para a sua viabilização tais como: segurança, manutenção, limpeza, etc., passando por questões culturais, sociais, educacionais e tantas outras quer contextualizadas no tempo, quer vinculadas necessariamente ao Estado e à gestão pública das cidades.
Pelo grupo de pesquisa do qual faço parte (http://quapasel.wordpress.com), viajei o país todo e vi que existe vida pública (realização da apropriação do espaço urbano) intensa, incluindo as praças. E também nas ruas, nos parques e nos locais mais improváveis. Durante a pesquisa, encontramos 105 novos tipos de espaços livres públicos onde a esfera pública se materializa das formas mais imprevisíveis. Eugênio Queiroga, colega de pesquisa, cunhou o termo “pracialidade” para determinados tipos de uso público em espaços livres urbanos (privados e públicos). Não é interessante?
Acho até qe o conceito “praça” é histórico, ou ainda, está “datado” e com ele também está datada a sua forma. No Brasil, o conceito se afasta ainda mais de suas origens… mas isso, é prosa para outro email… rs
Verei o que tenho (texto) e depois envio para você.
Sorte em seu trabalho,
Helena
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Encontrei no termo concebido pelo Eugênio Queiroga, um ponto de partida para novas buscas, deste espaço tao antigo e ao mesmo tempo tao presente ou ausente espacialmente da nossa ação cotidiana, percebida em nossas movimentações frenéticas pela cidade desfigurada das suas feições naturais de ir e vir com prazer, segurança e estética.Me reportei a este texto muito bom como exercício matinal de desenvolvimento de um projeto DE ESPAÇO PÚBLICO no interior de Mato GROSSO. Grata pela reflexão, anotei o linc, gostaria de me encontrar mais vezes sobre este tema tao necessário nos nossos dias atuais, atenciosamente arq. Ana Rita Maciel/AMM- Associação Mato grossense dos Municípios de MT.
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